Habeas Corpus – 0002173-38.2019.4.02.0000

RELATOR: DESEMBARGADOR ABEL GOMES -  

DECISÃO  

Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado por JOSE MARCELO CARVALHO CORTES e outro, em favor de MARCO ANTONIO DE FARIA FRANÇA, contra ato praticado, nos autos n.º 006322326.1998.4.02.5101, pelo MM. Juízo da 7ª Vara Federal Criminal/SJRJ, visando, em liminar e no mérito, à remessa da carta de execução de sentença à Vara de Execuções Penais, independentemente do recolhimento do paciente ao cárcere. Os impetrantes sustentam, em síntese, que a autoridade coatora ignora a excepcionalidade da condição precária de saúde do paciente (que tem 74 anos), obstando que faça, em liberdade, os requerimentos pertinente acerca da execução de sua pena ao Juízo da Execução. Ressaltam que seu pleito tem amparo jurisprudencial. Aduzem, ainda, que o cumprimento do mandado de prisão servirá como verdadeira pena capital ao paciente, que está em tratamento quimioterápico e apresenta câncer de colón, em estágio de metástase, espalhado pelo pulmão e fígado; aneurisma de aorta e hipertensão. O writ foi instruído com documentos (fls. 19/199). Relatados. Decido.  O paciente restou condenado à pena definitiva 8 (oito) anos de reclusão e 500 dias-multa, no valor de 1 salário mínimo vigente à época dos fatos, a ser cumprida em regime inicialmente fechado. Friso que o presente writ foi impetrado em 28/05/2019 e que a decisão impugnada data de 23/08/2017 (fls. 165/166), ou seja, a situação atual de saúde do paciente, que fundamenta o pleito - segundo se extrai dos documentos juntados aos autos e de consulta eletrônica aos autos originários (físicos) - sequer foi submetida a autoridade apontada como coatora, que analisou a questão a quase dois anos. Em que pese tal ponderação, à vista do indeferimento pelo Juízo a quo dos requerimentos defensivos – quais sejam colocação do paciente em regime domiciliar, alteração do regime inicial do cumprimento da pena ou, subsidiariamente, remessa de carta de execução da sentença independente do seu recolhimento, este último objeto deste habeas corpus – sem analisar as circunstancias de saúde e idade do paciente, passo a apreciar o mérito do writ. Nesse passo, cumpre transcrever trecho da decisão impetrada:  “As questões arguidas pela Defesa às fls. 1738/1740 em relação às circunstâncias do condenado MARCO ANTONIO DE FARIA FRANÇA, quais sejam, ser maior de 70 anos de idade e portador de doença grave, para pleitear mudança de regime inicial de cumprimento de pena, são atinentes à execução penal e competem ao Juízo da execução penal, conforme dispõe o art. 66, III, da Lei nº 7.210/84. Além disso, a questão trazida pela Defesa quanto ao regime de cumprimento da pena já foi apreciada no julgamento da Apelação interposta, acórdão às fls. 1702/1705, no sentido de negar provimento ao recurso. Ademais, foi expedido mandado de prisão, porém ainda não há informação de que tenha sido cumprido, fato que ensejaria a expedição de Carta de Execução de Sentença. Pelo exposto, acolho a manifestação ao MPF, às fls. 1763/1764, e INDEFIRO o requerimento da Defesa de fls. 1738/1740. Intimem-se.” Como venho salientando em outros habeas corpus, com o trânsito em julgado da condenação, fica encerrada a prestação jurisdicional do juízo de conhecimento, não cabendo sua manifestação a respeito do recolhimento em residência particular, questão afeta a execução penal (ainda não iniciada no caso) que deverá ser analisada pelo juízo da VEP (súmula 192 do STJ). Confira-se: "HABEAS CORPUS SUBSTITUTO DE RECURSO PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. CONDENAÇÃO. TRÂNSITO EM JULGADO. PEDIDO DE PRISÃO DOMICILIAR FORMULADO PERANTE JUÍZO DE CONHECIMENTO. ENCERRAMENTO DA JURISDIÇÃO. PRECLUSÃO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DAS EXECUÇÕES. PACIENTE EM LOCAL INCERTO E NÃO SABIDO. NÃO RECOLHIMENTO À PRISÃO. ÓBICE AO INÍCIO DA EXECUÇÃO PENAL. IMPOSSIBILIDADE DE ACESSO AO JUDICIÁRIO. CIRCUNSTÂNCIA EXCEPCIONAL QUE JUSTIFICA EMISSÃO DE GUIA DE EXECUÇÃO INCONDICIONADA À PRISÃO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.  (...)2. Com a superveniência do transito em julgado em relação à condenação, fica encerrada a prestação jurisdicional do juízo de conhecimento, não cabendo sua manifestação nos autos a respeito do cabimento de cumprimento da pena em prisão domiciliar. Precedentes. (...)" (Grifei) (STJ, Quinta Turma, HC 366616/SP, Rel. Min. REYNALDO SOARES DA FONSECA, DJe 05/05/2017, unânime). Nesse passo, cumpre elucidar que a expedição da guia de recolhimento - e consequente início da competência do juízo das execuções - demanda prévia prisão do apenado, nos termos do art. 105 da Lei de Execução Penal e do art. 674 do Código de Processo Penal. Nesse sentido: "PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO HABEAS CORPUS. SUSTENTAÇÃO ORAL. IMPOSSIBILIDADE. EXECUÇÃO PENAL. EXPEDIÇÃO DA GUIA DE RECOLHIMENTO. MANDADO DE PRISÃO NÃO CUMPRIDO. EXECUÇÃO NÃO INICIADA. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO.  (...)2. De acordo com o art. 105 da Lei de Execuções Penais, a guia de expedição de recolhimento para a execução será expedida se o réu estiver ou vier a ser preso. Dessa forma, ainda não cumprido o mandado de prisão, não há se falar em ilegalidade na ausência de expedição da guia de recolhimento do recorrente. (...)." (Grifei) (STJ, Sexta Turma, AgRg no RHC 104220/RJ, Rel. Min. NEFI CORDEIRO, DJe 01/03/2019, unânime) RECURSO PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. PRETENSÃO DE QUE SEJA EXPEDIDA GUIA DE EXECUÇÃO ANTES DO CUMPRIMENTO DO MANDADO DE PRISÃO. IMPOSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE TERATOLOGIA OU MANIFESTA ILEGALIDADE. NÃO CONHECIMENTO. (...)3. De fato, consolidou-se nesta Superior Corte de Justiça entendimento no sentido de que, nos termos da legislação em vigor, especialmente os arts. 674 do Código de Processo Penal e 105 da Lei de Execução Penal, a guia de recolhimento será expedida após o trânsito em julgado da sentença, quando o réu estiver ou vier a ser preso. O fato de o apenado estar em lugar incerto e não sabido inviabiliza o início da execução. (...)” (Grifei) (STJ, Quinta Turma, HC 393.342/SE, Rel. Min. REYNALDO SOARES DA FONSECA, DJe 22/05/2017, unânime) Note-se que apesar do mandado de prisão ter sido expedido em 28/01/2016 (fl. 16 dos autos originários) e do longo período de tempo transcorrido, o paciente ainda está foragido, o que inviabiliza o início da execução da pena e, por consequência, o conhecimento da tese defensiva pelo Juízo da Execução Penal.  Embora a defesa tenha juntado documentos que indiquem que o paciente apresenta problemas de saúde (cuja aferição é inviável nesta via, pois demanda dilação probatória), estes não lhe garantem a concessão automática de recolhimento em residência particular (art. 117 da LEP). O deferimento ou não de tal benefício deverá ser apreciado pelo Juízo natural, que avaliará se a devida assistência à sua saúde poderá ser prestada em estabelecimento prisional e sopesará o fato do regime inicial de cumprimento da pena ser o fechado.  Ressalto que caso se entendesse possível a expedição de guia definitiva estando o paciente em local incerto, criar-se-ia hipótese que não se coadunaria com o disposto na Lei de Execução Penal, bem como possibilitaria que cumprimento de pena ainda não iniciado pudesse ser suspenso, impactando, inclusive, na contagem do prazo prescricional. Melhor seria se a defesa impetrasse um habeas corpus preventivo diretamente no Tribunal de Justiça, competente para apreciar decisões do Juízo da Vara de Execução Penal, porquanto, com o apenado foragido, a decisão do Juízo da 7ª Vara Federal Criminal, no sentido de apreciar a situação pessoal do paciente, é até mesmo inócua. Ante o exposto, com base na fundamentação acima e com fulcro no art. 177 c/c art. 44, §1º, inc. II, ambos do Regimento Interno, indefiro liminarmente o pedido, ante a manifesta improcedência.  Com o trânsito em julgado, dê-se baixa na Distribuição e arquivem-se os autos, com as cautelas de estilo. Rio de Janeiro, 30 de maio de 2019.  (assinado eletronicamente – art. 1º, § 2º, inc. III, alínea a, da Lei nº 11.419/2006) ABEL GOMES Desembargador Federal Relator

 

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