EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE Nº 0006251-86.2006.4.03.6181/SP

RELATOR : Desembargador Federal JOSÉ LUNARDELLI -  

Embargos infringentes. "operação oceanos gêmeos" lavagem de dinheiro. Preliminar de intemprestividade do recurso de pablo alegada pelo ministério público federal. Rejeitada. Absolvição de elizabeth manrique albear. Ausência de dolo. Condutas de lavagem praticadas por pablo rayo montaño e miguel felmanas. Condutas de internalização do dinheiro e as seguintes aquisições ou compras de bems decorrentes do mesmo valor internalizado. Crime único de lavagem. Aquisições de obras de arte - cavalos e jóias - crimes da mesma espécie - que ocorreram em consiões semelhantes de tempo - lugar e maneira de execução. Continuidade delitiva configurada. Prevalência do voto vencido. Embargos infringentes providos. I - Alegação do Ministério Público Federal de que os embargos infringentes opostos pela defesa de Pablo Joaquim Rayo Montaño são intempestivos, vez que interpostos antes do julgamento dos embargos de declaração nos embargos, opostos pela defesa de Miguel Felmanas, não procede. Preliminar rejeitada. II - O argumento do parquet federal assentava-se na Súmula 418 do STJ ("É inadmissível o recurso especial interposto antes da publicação do acordão dos embargos de declaração, sem posterior ratificação."). Entretanto, o STJ cancelou formalmente referida súmula 418 e editou outro enunciado que agora espelha o entendimento atual do E. Tribunal Superior na Súmula 579-STJ ("Não é necessário ratificar o recurso especial interposto na pendência do julgamento dos embargos de declaração, quando inalterado o resultado anterior.") III - Os embargos de declaração dos embargos de declaração opostos pela defesa de Miguel Felmanas foram desprovidos (fls. 7155/7159), razão pela qual prescindível a ratificação dos embargos infringentes opostos pela defesa de Pablo Joaquim Rayo, nos termos da referida Súmula 579 do STJ. IV - No tocante às condutas de internalização do dinheiro e subsequentes aquisições de bens, a forma como foram narradas na denúncia e posteriormente comprovadas, durante a instrução processual, demonstra que a internalização do dinheiro (no caso, R$ 814.000,00) configura a primeira fase da lavagem, qual seja, a ocultação do valor ilícito, enquanto as condutas subsequentes, consistentes na aquisição de alguns bens, caracterizam a segunda fase, ou seja, a dissimulação para a consequente integração de tais bens na economia formal, condutas tais que foram praticadas no mesmo contexto fático e que envolviam o mesmo valor, com a finalidade única (ou seja, mesmo elemento subjetivo) de lavar essa específica quantia de dinheiro ilícito internalizada no país. V - Portanto, foi praticada uma sequência de atos por Pablo e Miguel, em coautoria, voltada ao ato final de integração do mesmo capital ilícito na economia formal. Ressalte-se, capital internalizado no país justamente para tal fim. VI - O caput do artigo 1º, da Lei n.º 9.613/1998, descreve dois comportamentos distintos, quais sejam, ocultar e dissimular. Entretanto, não se deve olvidar que se trata de crime de ação múltipla, em que a realização de qualquer das condutas descritas concretiza a consumação do delito de lavagem de dinheiro, desde que, por óbvio, acompanhada do elemento subjetivo do tipo (finalidade de reinserir o dinheiro "sujo" na economia formal, de forma a dar-lhe aparência de lícito). Portanto, inadmissível aqui o concurso de delitos no caso em que o agente pratica as duas ações descritas no tipo penal, dentro do mesmo contexto fático e sobre o mesmo numerário. VII - Da mesma forma, as condutas descritas no § 1º do mesmo artigo indicam formas de ocultação ou dissimulação dos bens. Portanto, é comum a identidade, no caso concreto, entre as condutas do caput (de caráter geral) e as previstas no § 1º, uma vez que quem pratica estas, em regra, também realiza aquelas previstas no caput, não podendo ser condenado de forma autônoma, quando tais condutas são praticadas na mesma contextura e com a mesma finalidade. VIII - As condutas de aquisição de obras de arte; cavalos e jóias foram praticadas, por Pablo, em continuidade delitiva, uma vez que tais bens foram adquiridos todos com a mesma finalidade de ocultar os ativos advindos do narcotráfico, com certa identidade em termos de tempo e modo de execução. Não é razoável admitir a existência de tantos crimes (em concurso material), quantos forem os procedimentos distintos adotados, quando a execução dos delitos indica que as condutas subsequentes foram realizadas como continuação da primeira, sobretudo com o mesmo fim precípuo de lavar o dinheiro decorrente do tráfico internacional de drogas. IX - A absolvição de Elizabeth Manrique Albear deve ser mantida. Da leitura da denúncia, não verifico a narrativa de condutas praticadas pela ora embargante que se caracterizem como crime de lavagem de dinheiro, na modalidade ocultação, sobretudo diante da ausência do elemento subjetivo, qual seja, a vontade ou intenção de limpar o capital e reinseri-lo no círculo econômico com aparência lícita. X - As condutas de guardar e utilizar bens móveis valiosos (ressalte-se, os quais sequer foram individualizados na denúncia), notadamente jóias (aliás, mulheres costumam ser presenteadas pelos maridos com jóias) não são condutas que se subsumem ao art. 1º da Lei n.º 9.613/98 (vigente à época dos fatos), se desprovidas do elemento subjetivo do delito. XI - Além disso, os poucos diálogos decorrentes de interceptações telefônicas, que registram Elizabeth tratando de remessa de dinheiro para Pablo, utilizados pelo voto condutor para condená-la pela prática do crime acima descrito, a meu ver, são insuficientes, pois, além de não provarem nenhuma ocultação de bens por ela praticada (conduta pela qual foi denunciada) também não vêm corroborados por outros elementos de prova, produzidos em juízo e sob o crivo do contraditório, que demonstrem sua eventual coautoria com o então marido, na prática do crime de lavagem de dinheiro, na modalidade ocultação. XII - Embargos infringentes providos.

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