ACR – 10713/CE – 0002992-82.2012.4.05.8100

RELATOR: DESEMBARGADOR PAULO ROBERTO DE OLIVEIRA LIMA -  

Penal. Processo penal. Crimes capitulados no decreto-lei nº 201/67, art. 1º, i e vii, decorrentes da execução viciada de dois convênios federais. Imputação dirigida a ex-prefeito. Absolvição dos ilícitos de falta de prestação de contas. Desvio de recursos públicos comprovados no dois casos. Ajuste na dosimetria das penas. Apelação parcialmente provida. 1. Cuida-se de apelação interposta por JOÃO ANTÔNIO DESIDÉRIO DE OLIVEIRA contra sentença que, julgando procedente a denúncia, condenou-o como incurso nas penas do Art. 1º, I e VII, do Decreto-lei nº 201/67, aplicando-lhe as penas de 18 (dezoito) anos de reclusão para o delito tipificado no Art. 1º, I; de 03 anos e 06 meses de detenção para os crimes previstos no Art. 1º, VII; mais perda do cargo e inabilitação, pelo prazo de 05 (cinco) anos, para o exercício de cargo, emprego ou função pública; e valores mínimos para reparação do dano fixados em R$ 700.000,00 (setecentos mil reais) para o FNDE e R$ 55.000,00 (cinquenta e cinco mil reais) para o DNOCS; 2. O apelante exerceu o cargo de Prefeito do Município de Palmácia/CE, fato que lhe permitiu a movimentação da conta dos convênios firmados com o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e com o Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS), às quais foram repassados, respectivamente, os valores de R$ 700.000,00 e R$ 55.000,00, destinados à construção de uma creche infantil e de uma adutora de água. Posto que tenha havido a liberação da verba (quase total num caso, total em outro) sem que as obras tivessem sido construídas, o réu, que também não prestou conta dos valores aplicados, foi condenado; 3. Em suas razões, o acusado suscita (i) suposta nulidade processual por cerceamento do direito de defesa; (ii) falta de nexo autoral entre si e o fato delituoso; (iii) que a responsabilidade pela prestação das contas dos convênios não seria mais sua, e sim de seu sucessor; (iv) que as obras conveniadas teriam sido realizadas; (v) a perda de informações devido ao lapso temporal entre o início das obras com a data de realização da perícia. 4. Não houve cerceamento do direito de defesa. Para demonstrá-lo, convém gizar que este processo foi sentenciado numa primeira ocasião, mas o TRF5, divisando que as perícias levadas a termo pelos órgãos de controle haviam sido feitas unilateralmente, sem submissão, pois, ao contraditório e à ampla defesa, bem assim que o réu pugnara pela realização de perícia judicial, findou por anulá-la (a sentença), determinando o retorno dos autos à origem para que as investigações técnicas fossem finalmente praticadas, como foram, tendo sido inclusive acompanhadas por assistente técnico, ao qual se assegurou a prerrogativa de manifestar-se; 5. É verdade, por outro lado, que o prazo final para execução dos convênios deu-se na gestão do sucessor, de modo que a responsabilidade para a prestação das contas não pode ser atribuída ao réu. Toda a jurisprudência (inclusive do TCU) estabilizou-se neste sentido. Assim, a condenação pelos crimes capitulados no Decreto-lei 201, Art. 1º, VII, não subsiste; 6. As provas coligidas aos autos, todavia, são sólidas em favor da acusação no que concerne ao crime de desvio das verbas públicas (nos dois casos narrados). Os laudos elaborados pelos órgãos de controle (na época própria) e aquele elaborado em sede judicial (agora) apontam que as empresas, conquanto tenham recebido os recursos dos dois convênios (a totalidade num caso, a quase totalidade no outro), deixaram de entregar as obras (até hoje ainda não concluídas); 7. O argumento de que houve mudanças nos projetos e, por elas, gastos que comprometeram a conclusão exitosa das obras não prospera. De um lado porque, quando houve mudança no escopo original do "negócio", fez-se a necessária adaptação orçamentária. De outro, porque isso jamais explicaria a disponibilização integral dos valores às empresas em curtíssimo espaço de tempo, vulnerando a dinâmica estabelecida nos convênios e as garantias contratualmente estabelecidas; 8. As penas pelos dois crimes de "desvio", cometidos em concurso material (CP, Art. 69), merecem os seguintes ajustes: 8.1) a pena privativa de liberdade relativamente ao desvio dos valores destinados à construção da adutora reduz-se de 08 para 04 anos de reclusão [a exasperação da pena-base para quatro anos justifica-se pelas graves consequências do crime (significando comprometimento do abastecimento hídrico em região castigada pela seca) e pela elevada culpabilidade do réu (procurador da República aposentado), não havendo circunstância agravante ou atenuante, nem causa de aumento ou diminuição]; 8.2) a pena privativa de liberdade relativamente ao desvio dos valores destinados à construção da creche reduz-se de 10 para 06 anos de reclusão [a exasperação da pena-base a seis anos justifica-se pelas graves circunstâncias do crime (altos valores desviados), por suas consequências (significando comprometimento do acolhimento e da educação de crianças carentes) e pela elevada culpabilidade do réu (procurador da República aposentado), não havendo circunstância agravante ou atenuante, nem causa de aumento ou diminuição]; 8.3) por ambos os crimes, então, cometidos em concurso material, fixa-se a pena conjunta em 10 anos de reclusão, em regime inicialmente fechado. 9. A fixação do "valor mínimo da reparação do dano" já agora, nos termos do CPP, Art. 387, IV, exigiria pedido expressamente formulado na denúncia, o que não houve, de modo que é preciso haver o decote da punição também nesta parte; 10. Apelação, nestes termos, parcialmente provida.

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