ACR – 12636/PE – 2004.83.00.012439-9 [0012439-57.2004.4.05.8300]

RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL FERNANDO BRAGA -  

DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIME DE FALSIDADE IDEOLÓGICA. ART. 299 DO CÓDIGO PENAL. PRESCRIÇÃO RETROATIVA. APELAÇÃO PREJUDICADA. CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. OBTENÇÃO DE FINANCIAMENTO EM INSTITUIÇÃO FINANCEIRA OFICIAL MEDIANTE FRAUDE. ART. 19, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI Nº 7.492/86. PRESCRIÇÃO RETROATIVA DOS CRIMES IMPUTADOS AOS MUTUÁRIOS. APELAÇÕES PREJUDICADAS. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADA PARA OS DEMAIS RÉUS. REVISÃO DA DOSIMETRIA DA PENA COM RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO RETROATIVA. APLICAÇÃO DOS RECURSOS OBTIDOS EM FINALIDADE DIVERSA. ART. 20 DA LEI Nº 7.492/86. PÓS-FATO IMPUNÍVEL. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. APELAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL IMPROVIDA. 1. Apelações do Ministério Público Federal e da Defesa contra sentença do juízo da 28ª Vara Federal de Pernambuco que julgou procedente em parte ação penal para condenar os réus pelo cometimento de crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, previstos no Art. 19, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86, por terem obtido financiamentos junto ao Banco do Nordeste do Brasil (BNB) com documentos falsos. 2. A extinção da punibilidade pela prescrição é matéria de ordem pública, pelo que deve ser conhecida de ofício pelo juízo, nos termos estatuídos pela regra do Art. 61 do Código de Processo Penal, sendo que a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva prejudica o exame do mérito da apelação criminal, consoante entendimento consolidado na Súmula nº 241 do extinto Tribunal Federal de Recursos - TFR. 3. Reconhecimento de ofício da prescrição retroativa em relação ao réu José Siqueira Leite, quanto ao crime de falsidade ideológica, previsto no Art. 299 do Código Penal, pela pena imposta em concreto em 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão, para cada crime cometido em concurso material, considerando que o fato ocorreu em 2000 e a denúncia foi recebida em 28/8/2008. Prejudicada a apelação da Defesa. 4. Reconhecimento de ofício da prescrição retroativa dos crimes de obter financiamento mediante fraude, previstos no Art. 19 da Lei nº 9.742/86, pelas penas impostas em concreto aos mutuários Ires Sinésio Torres, Janice Freitas de Lima, Jonas Freitas de Lima, Lailson de Freitas de Andrade, Maria das Graças Ferreira de Melo, em 3 (três) anos e 4 (quatro) meses de reclusão. Hipótese em que transcorreram mais de 8 (oito) anos entre a data dos fatos (1999 e fevereiro/2000) e o recebimento da denúncia (28/8/2008). Prejudicadas as apelações da Defesa. 5. As constatações realizadas pela equipe de auditoria do BNB evidenciam a prática de fraude nos anos de 1998 e 2000, consubstanciada na apresentação de documentos falsos, que possibilitaram a concessão de empréstimos indevidos e desvio de recursos financeiros, sempre com a participação de sócios e funcionários da empresa PLANEJAR - PLANEJAMENTO E ASSISTÊNCIA TÉCNICA RURAL LTDA, que era credenciada junto ao BNB para a elaboração, execução e acompanhamento de projetos de interesse de clientes do banco. Precedente desta Terceira Turma no julgamento de um dos acusados, em processo desmembrado (ACR nº 12510/PE, Rel. Des. Federal Paulo Machado Cordeiro, j. 27/8/2015, DJe 2/9/2015). 6. A prova dos autos é conclusiva e indene de dúvidas quanto à autoria dos crimes, em relação aos réus vinculados à empresa PLANEJAR, que elaborava projetos e fiscalizava sua execução, e prestava serviços de assessoria técnica pagos pelo BNB. Os réus José Rivaldo Mariano Freire e Flávio Marcos Dias, na condição de sócios desta empresa, foram responsáveis pela confecção de documentos ideologicamente falsos que permitiram a concessão indevida dos créditos rurais. Já Adelmo Araújo da Silva, funcionário da empresa, concorreu para os fatos como técnico responsável pela realização de visitas às propriedades e como autor material de laudos ideologicamente falsos. 7. É cabível a exasperação da pena do mínimo legal por decisão devidamente fundamentada, desde que baseada na análise adequada das circunstâncias judiciais previstas no Art. 59 do Código Penal. Revisão das penas aplicadas que se impõe considerando que a valoração negativa das consequências do delito, pelo prejuízo social e econômico causado à região, não está baseada em dados concretos. Pena-base aplicada aos réus José Rivaldo Mariano Freire, Flávio Marcos Dias e Adelmo Araújo da Silva em 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão, aumentada em 1/3, por ter sido cometido crime em detrimento de instituição financeira oficial (Art. 19, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86), resultando na pena provisória de 3 (três) anos e 4 (quatro) meses. Aumento da pena na fração de 1/4 pela continuidade delitiva, resultando na pena definitiva de 4 (quatro) anos e 2 (dois) meses. 8. Reconhecimento de ofício da prescrição retroativa pela pena aplicada em concreto, considerando que, segundo entendimento consolidado na Súmula nº 497 do STF, quando se tratar de crime continuado, a prescrição regula-se pela pena imposta na sentença, não se computando o acréscimo decorrente da continuação. Hipótese em que transcorreram mais de 8 (oito) anos entre a data dos fatos (1999 e fevereiro/2000) e o recebimento da denúncia (28/8/2008). 9. O crime de aplicar os recursos do financiamento em finalidade diversa da prevista em lei ou contrato (Art. 20 da Lei nº 7.492/86) é absorvido pelo delito de obtenção fraudulenta de financiamento (Art. 19 da Lei nº 7.492/86) quando, dentro de um mesmo contexto fático, o desvio de finalidade se apresenta como exaurimento da conduta delituosa de fraudar a obtenção do financiamento. Hipótese em que, diante das circunstâncias do caso concreto, a aplicação dos recursos obtidos em outros fins constituiu mero exaurimento do crime anterior, devendo ser considerado pós-fato impunível e não outra conduta delitiva autônoma. Precedentes desta Corte Regional (ACR nº 13151/CE, Rel. Des. Federal Leonardo Augusto Nunes Coutinho (Convocado), 4ª Turma, j. 3/10/2017; ACR nº 10201/CE, Rel. Des. Federal José Maria Lucena, 1ª Turma, j. 25/6/2015). 10. Promulgada a prescrição retroativa em relação aos réus José Siqueira Leite, Ires Sinésio Torres, Janice Freitas de Lima, Jonas Freitas de Lima, Lailson de Freitas de Andrade, Maria das Graças Ferreira de Melo, prejudicadas as apelações da Defesa. Apelações dos réus José Rivaldo Mariano Freire e Flávio Marcos Dias providos em parte, com reconhecimento de ofício da prescrição retroativa. Apelação do Ministério Público Federal improvida.

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