ACR – 13530/SE – 0000366-80.2014.4.05.8501

RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL LEONARDO CARVALHO -  

PENAL. CRIME DE ESTELIONATO CONTRA A PREVIDÊNCIA SOCIAL. SALÁRIO MATERNIDADE. RURÍCOLA. FATO GERADOR ANTERIOR À CONDIÇÃO DE SEGURADA ESPECIAL. OBTENÇÃO DE BENEFÍCIO MEDIANTE ARTIFÍCIO FRAUDULENTO. DOCUMENTAÇÃO IDEOLOGICAMENTE FALSA. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS DEMONSTRADAS. CONDENAÇÃO FUNDADA EM CONJUNTO PROBATÓRIO FIRMADO NA FASE INQUISITORIAL CORROBORADO EM JUÍZO. CRIME DE FALSIDADE IDEOLÓGICA ABSORVIDO PELO DE ESTELIONATO. AUSÊNCIA DE CONCLUSÃO PELA AUTORIA DA FALSIDADE PRESCINDÍVEL À APURAÇÃO DO CRIME DE ESTELIONATO. CONSCIÊNCIA DA NÃO LICITUDE DA OBTENÇÃO DO BENEFÍCIO PRETENDIDO. PENA PECUNIÁRIA SUBSTITUTIVA. ARBITRAMENTO. SITUAÇÃO ECONÔMICA. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO PENAL. PRECEDENTES. 1. Cuida-se de apelação interposta contra sentença que julgou procedente a pretensão punitiva estatal para condenar, como incursas nas penas do art. 171, § 3º, do Código Penal, Dalva Marinho Martins e Ana Clécia Pereira dos Santos, fixando-as, para cada qual, em 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão, em regime de cumprimento inicialmente aberto, e em 13 (treze) dias-multa, valorado unitariamente em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, substituída a primeira por duas restritivas de direitos, noticiando a denúncia que as acusadas, em unidade de desígnios, no dia 21 de setembro de 2011, obtiveram, mediante ardil consistente na utilização de declaração falsa do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), vantagem indevida (beneficio de salário maternidade) junto à Agência da Previdência Social (APS) de Canindé do São Francisco/SE, acarretando um prejuízo no valor aproximado de R$ 2.000,00 (dois mil reais) aos cofres públicos, contando a empreitada, ainda, com a participação do então gerente da APS, Araty Alves Vilela, já falecido, que recebia "comissão" pelas concessões indevidas de benefícios, acrescentando a peça acusatória que a acusada Ana Clécia Pereira dos Santos, após ter pedido de salário maternidade negado pela autarquia previdenciária, por não se enquadrar nos requisitos autorizadores, conheceu a corré Dalva Marinho Martins, que intermediou a obtenção do benefício por intermédio do servidor da APS antes nominado, de quem alegava ser amiga, recebendo essa, da primeira ré, seus documentos, vindo a informar, posteriormente, que deveria procurar o "guarda" da APS que a levaria até o servidor Araty, perante o qual "assinou uns três ou quatro papéis", e que, após a obtenção do  benefício, quando essa foi pago, a corré Dalva Marinho Martins já se encontrava no banco e havia sacado os valores, antes mesmo da beneficiária Ana Clécia Pereira dos Santos chegar, ficando aquela com R$ 700,00 (setecentos reais) e entregando o restante a essa última. 2. Em suas razões recursais, Dalva Marinho Martins aduz encontrar-se a condenação baseada em declarações realizadas na fase inquisitorial e em provas ali produzidas (declaração do INCRA, processo administrativo do INSS e ofícios do INCRA), sendo inconclusivo o laudo pericial da Polícia Federal quanto à falsificação da declaração; incidir na hipótese o princípio do in dubio pro reo, pugnando pela absolvição a teor do art. 386, V e VII, do Código de Processo Penal, enquanto que Ana Clécia Pereira dos Santos alega a insuficiência de materialidade e da autoria, por não restar comprovada a conduta de falsificação da documentação a ela imputada, além do que não tinha consciência da ilicitude do ato em questão, pugnando pela absolvição a teor do art. 386, III, do Código de Processo Penal e, subsidiariamente, pretende a redução da pena pecuniária substitutiva, diante da sua precária situação econômica. 3. Como apontado na sentença, a condenação não se encontra fundada tão somente nos elementos obtidos na fase inquisitorial, eis que corroborados pela prova testemunhal colhida em juízo, submetida ao contraditório, além do que a prova documental representada pela declaração do INCRA apresentada para fins de demonstrar a condição de rurícola da ré Ana Clécia Pereira dos Santos, a par da informações posteriores do INCRA (ofícios que repousam às fls. 59/61 do IPL), demonstra conter conteúdo ideologicamente falso ao se apontar que o ali declarado - de que fazia parte do assentamento rural Manoel Dionízio Cruz desde 2 de agosto de 2004 - não condiz com a realidade, tendo em vista a inexistência de dados anteriores ao ano de 2007 nos registros do INCRA, mas tão somente, naquele assentamento, a partir de 23 de setembro de 2008,  situação essa posterior, inclusive, ao nascimento do seu filho, fato gerador do benefício buscado junto à autarquia previdenciária, a demonstrar, inclusive, consciência da ausência de licitude na pretensão ao benefício. 4. Ainda que negada a participação delitiva pela corré Dalva Marinho Martins, em que pese perante a autoridade policial haver ela sustentado, em mais de uma oportunidade, a versão de haver participado em auxílio para a concessão do benefício, para tanto cobrando da corré beneficiária quantia em dinheiro a ser repassada ao servidor envolvido, as provas colhidas em juízo, em especial as declarações prestadas pela corré Ana Clécia Pereira dos Santos, conduzem à convicção de veracidade quanto ao declarado no curso do IPL. 5. A situação de o laudo pericial da Polícia Federal, que se mostrou inconclusivo quanto à autoria da falsidade do documento apresentado à autarquia previdenciária para embasar a concessão do benefício, não se mostra hábil a afastar a falsidade ideológica, sendo essa demonstrada a partir de diligências empreendidas pelo INCRA em seu banco de dados, comprovando serem inverídicas as informações ali contidas. E, nesse ponto, ressalte-se não se imputar às ora apelantes o crime de falsidade, ou mesmo de uso de documento falso, por absorvido pelo de estelionato. 6. É de se afastar as alegações de não existir provas de haver concorrido para a infração penal, ou mesmo suficiente à condenação, por parte de uma das apelantes, e de o fato apresentado não constituir infração penal, pela outra. 7. No que diz respeito ao pedido subsidiário de redução da pena pecuniária substitutiva, é o entendimento desta col. 2ª Turma de que cabe ao juízo da execução avaliar eventual miserabilidade jurídica do sentenciado, examinando as condições socioeconômicas para o cumprimento de pena pecuniária sem prejuízo para seu sustento e de sua família, bem como possibilitá-lo no decurso do lapso fixado para a pena privativa de liberdade substituída. Nesse sentido: ACR8976/SE, rel. Des. Federal Ivan Lira de Carvalho (conv.), DJe 22.07.2015; ACR-12647/PE, rel. Des. Federal Leonardo Carvalho, DJe 26.09.2017. 8. Apelações manejada pela defesa improvidas.

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