ACR – 14282/PE – 0000686-39.2014.4.05.8305

RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO CORDEIRO -  

PROCESSUAL PENAL. APELAÇÕES DAS DEFESAS E DA ACUSAÇÃO. CRIMES DE ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA, QUADRILHA, CORRUPÇÃO ATIVA, CORRUPÇÃO PASSIVA, LAVAGEM DE DINHEIRO, ESTELIONATO QUALIFICADO, INSERÇÃO DE DADOS FALSOS EM SISTEMA INFORMATIZADO, FALSIDADES DOCUMENTAIS E FALSIDADES IDEOLÓGICAS. ALEGAÇÃO DE CERCEAMENTO AO DIREITO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. O JUÍZO ABRIU VISTA À PARTE PARA QUE INDICASSE QUANTAS TESTEMUNHAS UTILIZARIA PARA COMPROVAR CADA UM DOS FATOS E A DEFESA SE MANTEVE INERTE. NULIDADES PROCESSUAIS NÃO DEMONSTRADAS. O JUÍZO, AO LONGO DE TODA A INSTRUÇÃO, PRESERVOU OS DIREITOS AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA. CRIME DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA E FORMAÇÃO DE QUADRILHA. DELITOS PERMANENTES. SÚMULA 711 DO STJ. APENAS OS RÉUS QUE CONTINUARAM PARTICIPANDO DA EMPREITADA ILÍCITA MESMO APÓS A LEI 12.859/2013 FORAM CONDENADOS POR ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. A RÉ QUE PARTICIPOU DA EMPREITADA SOMENTE DURANTE PERÍODO ANTERIOR À ALUDIDA LEI FOI CONDENADA POR FORMAÇÃO DE QUADRILHA. INEXISTÊNCIA DE BIS IN IDEM. CRIMES DE ESTELIONATO QUALIFICADO CONTRA A PREVIDÊNCIA SOCIAL. RÉUS QUE, MEDIANTE USO DE DOCUMENTOS FALSOS, OBTIVERAM E RECEBERAM BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS INDEVIDAMENTE. CONDENAÇÃO. CRIME DE FALSIDADE IDEOLÓGICA. DOCUMENTOS (RGs, CPFs, ETC.) QUE NÃO FORAM UTILIZADOS PARA PERPETRAR ESTELIONATO QUALIFICADO, MAS SIM PARA OUTROS FINS, A EXEMPLO DE REQUERIMENTO PERANTE O DPF PARA PORTE DE ARMA DE FOGO. FALSIDADE QUE NÃO SE EXAURIU. CONDENAÇÃO. INOCORRÊNCIA DE BIS IN IDEM. CRIME DE FALSIDADE DOCUMENTAL. TRANSMISSÃO DE GFIPS COM VÍNCULOS TRABALHISTAS FALSOS. CONDENAÇÃO. INSERÇÃO DE DADOS FALSOS EM SISTEMA INFORMATIZADO. CRIME IMPUTADO APENAS AOS RÉUS QUE ERAM  FUNCIONÁRIOS DO INSS. OS RÉUS QUE SE BENEFICIÁRAM DA ALUDIDA INSERÇÃO FORAM CONDENADOS POR CRIMES DIVERSOS. INOCORRÊNCIA DE BIS IN IDEM. CORRUPÇÃO ATIVA E PASSIVA. RÉU QUE OFERECEU DINHEIRO AOS FUNCIONÁRIOS DO INSS PARA ISERIREM DADOS FALSOS. CONFIGURAÇÃO DE AMBOS OS DELITOS. LAVAGEM DE DINHEIRO. CRIAÇÃO DE PESSOAS JURÍDICAS E FÍSICAS FICTÍCIAS, UTILIZAÇÃO DE PESSOAS INTERPOSTAS, CONFUSÃO PATRIMONIAL, DENTRE OUTROS ARTIFÍCIOS PARA OCULTAR/DISSIMULAR A ORIGEM ILÍCITA DOS VALORES RECEBIDOS PELA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. CONSUMAÇÃO. DOSIMETRIA. OCORRÊNCIA EQUÍVOCOS, TAIS COMO BIS IN IDEM, CONSIDERAÇÃO DE ELENTARES DOS TIPOS PENAIS PARA AUMENTAR A PENA-BASE, ETC. NECESSIDADE DE REALIZAR NOVA DOSIMETRIA. PENAS REFEITAS. APELOS PARCIALMENTE PROVIDOS. 1. Trata-se de apelações interpostas por JOSÉ JOSUEL; DENILSON; DANIEL; MANOEL; LÚCIA; UBERLÚCIO; ANA RAFAELA; MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL; ABDIAS; SUZANNY; PAULO; MARIA MARLIETE e ÁLVARO em face de sentença proferida pelo juízo da 23ª Vara Federal de Pernambuco, que julgou a acusação parcialmente procedente. 2. Segundo a denúncia (fls. 03/53), no período entre 1998 a 2014, os denunciados, de forma livre, voluntária e em comunhão de desígnios, teriam se associado em organização criminosa para, mediante utilização de documentos material e ideologicamente falsos, inserção de dados falsos em sistema de informações e corrupção de servidores do INSS das agências de Jaboatão dos Guararapes /PE e Canhotinho/PE, induzirem em erro a Previdência Social e obterem valores relativos a diversos benefícios previdenciários indevidos, valores estes cuja origem e natureza foram ocultadas/dissimuladas pela utilização de nomes fictícios e interpostas pessoas físicas e jurídicas. A investigação policial teve início diante da informação de fls. 08 do IPL, da qual emergiu a suspeita de coincidência fraudulenta de dados de identificação entre as pessoas de "ABDIAS MARSOLINO DOS SANTOS JÚNIOR" e "ABDIAS MARCOLINO DO SANTOS JÚNIOR", as quais, apesar de terem CPFs, nomes de mães, datas de nascimento distintos, diante da pequena divergência entre os nomes (MARSOLINO e MARCOLINO), fez erguer a suspeita de tratarem-se da mesma pessoa que, todavia, recebia dois benefícios previdenciários (aposentadoria por invalidez e pensão por morte). Aprofundando as investigações, inferiu-se que a certidão de óbito que, em tese, teria ensejado a pensão do primeiro ABDIAS não existia (fls. 40 do IPL). Mas não só: em pesquisa perante o Instituto de Identificação Tavares Buril, verificou-se a existência dos dois ABDIAS (fls. 41/46 do IPL). Porém, a fotografia de fls. 45 do IPL não seria deste, mas sim de ÁLVARO, posteriormente identificado como integrante da organização criminosa descortinada. Na cadência, MANOEL, que era gestor da Agência do INSS de Canhotinho, informou não ter sido possível localizar o processo concessório da pensão por morte sob suspeita, o que apenas veio a reforçar a antevista fraude. Diante do panorama - mera ponta do iceberb -, as constatações iniciais foram submetidas a APEGE/SE/MPS, ocasião em que foram verificadas diversas irregularidades comedidas mediante o mesmo modus operandis. As concessões fraudulentas, em resumo, ocorriam da seguinte forma: havia inserção indevida de vínculos empregatícios no CNIS por meio de GFIPs declaratórias irregulares, além da utilização de registros civis falsos (registros de óbito, de nascimento e/ou casamento para a comprovação entre o instituidor do benefício e o titular/dependente). Ademais, 90% das concessões irregulares emergiram da APS de Canhotinho/PE com a participação do servidor, outrora gerente, MANOEL. Com base nas GFIPs declaratórias, vínculos empregatícios fictícios foram forjados, sem nenhuma contribuição à RFP, e, na cadência, dezenas de benefícios previdenciários foram deferidos e pagos indevidamente. Constatou-se ainda, no correr das investigações, que os vínculos empregatícios referentes a ABDIAS teriam sido informados à Previdência Social por LÚCIA, proprietária da empresa L A F SILVA - Prestações de Serviços, a qual também fora responsável por informar diversos vínculos empregatícios fictícios ao INSS com o intuito de atribuir indevidamente, aos integrantes do esquema e pessoas fictícias criadas pela organização criminosa, a qualidade de segurados. Identificou-se ainda que as transmissões de GFIPs mais recentes (a partir de 2011) envolvendo a L A F SILVA - Prestações de Serviços foram informadas por SUZANNY, as quais também deram ensejo ao recebimento indevido de vários benefícios previdenciários concedidos na mesma Agência do INSS de Canhorinho/PE e pelo mesmo funcionário: MANOEL. Para lograr êxito nas fraudes, inferiu-se ainda que ABDIAS ofereceu vantagem indevida, por diversas vezes, a servidores do INSS, quais sejam, MANOEL e PAULO, para que os benefícios referidos, de cuja fraude todos tinham conhecimento, fossem concedidos pelo INSS com base na documentação falsa apresentada e nos vínculos fictícios informados por LÚCIA e SUZANNY. Os valores sacados mensalmente pela organização criminosa possibilitaram um lucro de mais de R$ 11.000.000,00, cuja origem ilícita fora ocultada/dissimulada com a aquisição de postos de combustíveis, veículos, embarcações, relógios, imóveis, dentre outros, que tinham por titulares pessoas interpostas, também componentes do esquema delituoso. 3. Enfim, segundo o órgão acusador, a autoria e materialidade delitivas restaram evidenciadas pela farta documentação somada no IPL, máxime diante dos cartões de benefícios fraudulentos, CTPSs, RGs, CPFs, certidões de óbito falsos e em branco, extratos de contas bancárias de empresas e de beneficiários fictícios, imagens de câmeras das agências bancárias, informações policiais, fotografias, conversas telefônicas e mensagens interceptadas, processos de concessão de benefícios, interrogatórios, autos de apreensão, laudos periciais, etc. 4. Para ilustrar a organização criminosa, a denúncia, às fls. 17, trouxe, inclusive, organograma com a fotografia de cada integrante, suas ligações e participações. Em resumo: A) ABDIAS: "encabeçador do esquema", responsável pela atribuição das tarefas dos demais componentes da organização criminosa, pela falsificação de documentos utilizados nas instruções dos benefícios previdenciários, bem como por assegurar a concessão desses, apesar de irregulares, graças ao pagamento de propina aos servidores do INSS, quem sejam, MANOEL e PAULO. B) Em sua atuação, ABDIAS contou com o auxílio de: 1) LÚCIA e SUZANA, responsáveis por informar à Previdência Social vínculos empregatícios falsos com a suposta pessoa jurídica que integravam; 2) DANIEL e ÁLVARO, ambos titulares de benefícios fraudulentos, todos obtidos com uso de documentos falsos providenciados por ABDIAS, e também responsáveis por auxiliarem na "administração" do patrimônio ilícito auferido com o esquema delituoso, inclusive emprestando seus nomes como "laranjas" para ocultar/dissimular o produto das fraudes previdenciárias; 3) JOSÉ JOSUEL, advogado responsável pela postulação em juízo dos benefício indeferidos/suspensos pelo INSS; 4) UBERLÚCIO, também responsável por guardar os documentos falsos e permitir a inscrição de bens em seu nome para ocultar/dissimular a origem ilícita dos valores auferidos com os crimes; 4) MARIA MARLIETE, titular de benefícios previdenciários fraudulentos e pessoa que também emprestou seu nome para constar como proprietária de bens adquiridos com os valores ilícitos, ocultando/dissimulando a origem e natureza destes; 5) EVILÁZIO, conhecido de muitos anos de ABDIAS, com quem fazia transações comerciais escusas com a finalidade de encobrir a origem ilícita dos valores obtidos pela organização criminosa; 6) LILIAN, DENILSON, ANA RAFAELA e RENAN, pessoas próximas a ABDIAS e que, por fornecerem documentos e dados pessoais para a adulteração e posterior utilização junto ao INSS, foram recompensadas com benefícios previdenciários que sabiam indevidos. 5. Com base no panorama factual e jurídico sinalizado, o MPF imputou aos acusados os seguintes delitos: 6. ABDIAS: estelionato previdenciário (art. 171, § 3º, do CPB); falsificação de documento público (art. 297, § 3º, I, II e III, do CPB); inserção de dados falsos em sistema de informações (art. 313-A do CPB); associação criminosa (art. 288 do CPB); lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei n. 9.613/98, alterado pela redação dada pela Lei n. 12.683/2012); corrupção ativa (art. 333 do CPB) e participação em organização criminosa (art. 2º da Lei n. 12.850/2013), todos em concurso material (art. 69 do CPB). 7. LÚCIA: estelionato previdenciário (art. 171, § 3º, do CPB); falsificação de documento público (art. 297, § 3º, I, II e III, do CPB); inserção de dados falsos em sistema de informações (art. 313-A do CPB); associação criminosa (art. 288 do CPB); e participação em organização criminosa (art. 2º da Lei n. 12.850/2013), todos em concurso material (art. 69 do CPB). 8. SUZANNY: estelionato previdenciário (art. 171, § 3º, do CPB); falsificação de documento público (art. 297, § 3º, I, II e III, do CPB); inserção de dados falsos em sistema de informações (art. 313-A do CPB); associação criminosa (art. 288 do CPB); e participação em organização criminosa (art. 2º da Lei n. 12.850/2013), todos em concurso material (art. 69 do CPB). 9. ÁLVARO: estelionato previdenciário (art. 171, § 3º, do CPB); falsificação de documento público (art. 297, § 3º, I, II e III, do CPB); associação criminosa (art. 288 do CPB); lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei n. 9.613/98, alterado pela redação dada pela Lei n. 12.683/2012); e participação em organização criminosa (art. 2º da Lei n. 12.850/2013), todos em concurso material (art. 69 do CPB). 10. DANIEL: estelionato previdenciário (art. 171, § 3º, do CPB); falsificação de documento público (art. 297, § 3º, I, II e III, do CPB); associação criminosa (art. 288 do CPB); lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei n. 9.613/98, alterado pela redação dada pela Lei n. 12.683/2012); e participação em organização criminosa (art. 2º da Lei n. 12.850/2013), todos em concurso material (art. 69 do CPB). 11. MANOEL: estelionato previdenciário (art. 171, § 3º, do CPB); inserção de dados falsos em sistema de informações (art. 313-A do CPB); associação criminosa (art. 288 do CPB); corrupção passiva (art. 317 do CPB) e participação em organização criminosa (art. 2º da Lei n. 12.850/2013), todos em concurso material (art. 69 do CPB).

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