ACR – 15119/PE – 0006839-69.2015.4.05.8300

RELATOR: DESEMBARGADOR  MANOEL DE OLIVEIRA ERHARDT -  

PENAL E PROCESSUAL PENAL. AÇÃO PENAL. PRESCRIÇÃO RETROATIVA. NÃO OCORRÊNCIA. INÉPCIA DA DENÚNCIA. INEXISTÊNCIA. FRAUDE NA CONCESSÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. SEGURADO ESPECIAL. DECLARAÇÃO SINDICAL RURAL. FATO DECLARADO COM BASE EM OUTRO DOCUMENTO. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA FALSIDADE IDEOLÓGICA DA DECLARAÇÃO FIRMADA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS INDICATIVOS DE ATUAÇÃO DELITUOSA EM RELAÇÃO À FRAUDE PERPETRADA.  PRESIDENTE DO SINDICATO RURAL. ABSOLVIÇÃO. ART. 386, INCISO V, DO CPP. SERVIDORA RESPONSÁVEL PELA CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. CIRCUNSTÂNCIAS DA ATUAÇÃO ADMINISTRATIVA NA AGÊNCIA DO INSS. INEXISTÊNCIA DE INDICATIVO DE VÍNCULO COM A FRAUDE OCORRIDA E/OU DE BENEFÍCIO DELA ADVINDA. AUSÊNCIA DE PROVAS SUFICIENTES DE ATUAÇÃO DOLOSA. ABSOLVIÇÃO. ART. 386, INCISO VII, DO CPP. APELAÇÕES PROVIDAS. 1. A Apelante Maria José da Silva Costa foi condenada, na sentença apelada, à pena privativa de 3 (três) anos de reclusão, em regime aberto, pela prática do crime de inserção de dados falsos em sistema de informação (art. 313-A do CP), razão pela qual, tendo a referida inserção ocorrido em 08.06.2010 (fl. 44 do apenso I do IPL), posteriormente à entrada em vigor da Lei n.º 12.234, de 05.05.2010, não há que se falar em prescrição retroativa da pretensão punitiva estatal entre o fato delituoso e o recebimento da denúncia (16.10.2015) ou a data da prolação da sentença (20.03.2017 - fl. 303v.) ou, ainda, posteriormente ao trânsito em julgado para a acusação (21.03.2017 - fl. 305). 2. A denúncia ofertada nesta ação penal (fls. 12/28) descreve, de forma detalhada, os fatos objeto da fraude previdenciária referente à concessão do auxílio-reclusão n.º 25/153.200.276-6, estando acompanhada de elementos probatórios mínimos indicativos da materialidade do delito (resultado da auditoria administrativa apurada pelo INSS) e de indícios de autoria, com a devida individualização das condutas da Apelante Maria José da Silva Costa, não havendo, portanto, razão à alegação de inépcia da denúncia por ela reiterada em sede recursal. 3. A materialidade delitiva da fraude perpetrada contra o INSS em relação à concessão do auxílio-reclusão n.º 25/153.200.276-6, postulado pela Corré Maria José Felinto de Lima (em relação à qual foi o processo desmembrado) em favor de seu filho menor R.M. de L. S. restou devidamente demonstrada pela apuração administrativa realizada pelo INSS em que constatada a falsidade de documentos apresentados para embasar a qualidade de segurado especial do pai da referida criança (Rogério da Silva Santana), tendo sido demonstrada a ocorrência de prejuízo no valor de R$ 50.978,03 (cinquenta mil, novecentos e setenta e oito reais e três centavos). 4. Da leitura da declaração de exercício de atividade rural de fls. 6/6v do Apenso I do IPL anexo a estes autos, verificase que ela não indica que a pessoa em relação à qual emitida (Rogério da Silva Santana) era filiado do Sindicato Rural, mas, ao contrário, que não era, bem como informa o período de exercício de atividade rural de 01.01.1996 a 10.09.1999 em terras de Francisco de Santana, na localidade Sítio Mendes, informando a origem dessa informação como sendo a declaração do proprietário rural em questão. 5. A declaração de proprietário rural referida nessa declaração é aquela constante de fl. 29 do Apenso I do IPL anexo a estes autos, havendo, também, à fl. 32 do Apenso I do IPL anexo a estes autos, declaração de confrontantes confirmando as informações daquela declaração, também, tomada perante o STR de Limoeiro/PE. 6. Constata-se, assim, dos elementos acima, que a declaração sindical rural emitida pelo Apelante Manoel Augusto Gomes Neto apenas informou que o Sr. Rogério da Silva Santana, com base na própria declaração do proprietário rural, teria trabalhado nas terras deste de 01.01.1996 a 10.09.1999, não tendo, ademais, informado que ele fosse filiado ao Sindicato Rural. 7. Não houve, assim, afirmação pelo Apelante Manoel Augusto Gomes Neto de filiação sindical rural inexistente e a declaração de atividade rural por ele emitida tomou por base, e foi expressa nesse sentido, a declaração de atividade rural emitida pelo proprietário rural respectivo, ou seja, o fato declarado não é o exercício de atividade rural pura e simples, mas esse exercício de acordo com a declaração do proprietário apresentada ao Sindicato Rural de Limoeiro/PE. 8. Assim, mesmo que constatada a falsidade da informação de exercício da atividade rural pelo Rogério da Silva Santana e de outros documentos a ele referentes apresentados no INSS, não resta demonstrada a falsidade do fato declarado pelo Apelante Manoel Augusto Gomes Neto, que foi, apenas, o de que, de acordo com a declaração do proprietário rural ali indicado, esse segurado teria trabalhado nas terras dele. 9. Ressalte-se, nesse aspecto, que a possibilidade de emissão dessa espécie de declaração em favor de quem não é filiado ao sindicato rural decorre do próprio modelo previsto no Anexo XII da IN n.º 40/INSS/PRES, de 17.07.2009, que traz nos itens 15 e 16 do modelo da declaração as expressões "N.º da filiação no Sindicato (se houver)" e  "Data da Filiação (quando filiado)". 10. Assim, o fato de a diligência externa do INSS na fase de apuração administrativa não ter localizado informações de filiação de Rogério da Silva Santana nos livros do Sindicato Rural de Limoeiro/PE não tem relevância para a constatação da falsidade ou não da declaração emitida pelo Apelante Manoel Augusto Gomes Neto, pois, como já ressaltado, não houve nessa declaração menção à existência de sua filiação sindical. 11. Por outro lado, o exame da prova coligida nos autos não trouxe qualquer elemento que indicasse que o Apelante Manoel Augusto Gomes Neto tenha recebido valores para emitir a referida declaração sabendo da falsidade das informações da declaração do proprietário rural na qual ela se baseou nem que tenha ele atuado na intermediação da concessão fraudulenta do auxílio-reclusão indicado na denúncia. 12. Assim, não restou demonstrada a falsidade ideológica da declaração sindical rural emitida pelo Apelante Manoel Augusto Gomes Neto nos estritos termos do seu conteúdo declarado, nem qualquer outro vínculo dele com a conduta delituosa de fraude na concessão do auxílio-reclusão objeto da denúncia, o que conduz à conclusão de ausência de prova de que ele tenha concorrido para infração penal, impondo-se a sua absolvição nos termos do art. 386, inciso V, do CPP. 13. A Apelante Maria José da Silva Costa foi a servidora responsável pela concessão do auxílio-reclusão fraudado indicado na denúncia. 14. A prova colhida nos autos não indicou qualquer espécie de recebimento de valores por parte da referida Apelante vinculada à concessão do referido benefício previdenciário, nem a outros benefícios indevidamente concedidos objeto da apuração administrativa realizada naquela época, nem a existência de qualquer vínculo pessoal dela quer com o Corréu Manoel Augusto Gomes Neto ou com qualquer outra pessoa vinculada ao Sindicato Rural de Limoeiro/PE, nem, também, com a Corré  Maria José Felinto de Lima, mãe do beneficiário do referido benefício previdenciário concedido fraudulentamente. 15. A testemunha de acusação Leatrice Mota de Araújo, ouvida em juízo e que participou da apuração administrativa da qual resultou esta ação penal, informou que houve, na ocasião daquela auditoria administrativa, cinco servidores da mesma agência do INSS em relação aos quais, também, apurados fatos semelhantes aos imputados à Apelante Maria José da Silva Costa quanto à concessão de benefícios previdenciários indevidos. 16. Essa testemunha, outrossim, informou desconhecer a existência de qualquer treinamento por parte do INSS em relação aos servidores para fins de verificação de possíveis fraudes nas postulações de benefícios previdenciários anteriormente à época dos fatos apurados. 17. Embora, como ressaltado na sentença apelada, seja possível verificar inconsistências nos elementos informacionais e documentais constantes do processo administrativo de concessão do auxílio-reclusão objeto da denúncia, que a sentença apelada, inclusive, qualificou de "erros grosseiros" quanto à análise realizada pela Apelante Maria José da Silva Costa de seu conteúdo, não há elementos que permitam concluir pela atuação dolosa dessa servidora do INSS concluída pela sentença apelada, pois: cuida-se de servidora antiga, sem indicação de anterior histórico de atuações administrativa indevidas; por ocasião dos fatos a ela imputados, diversos outros servidores de sua agência, também, tiveram apurados contra eles concessões irregulares de benefícios previdenciários em circunstâncias similares, o que, acrescido da informação de ausência de treinamento específico para constatação de fraudes da espécie apurada e da rotina notória de sobrecarga de trabalho dos servidores do INSS, mostra-se como elemento razoável indicativo de um contexto fático propenso à ocorrência de concessões culposas de forma indevida de benefícios previdenciários; e a ausência de qualquer demonstração, mesmo que indiciária, de vínculo dessa Apelante ou de benefício por ela auferido em decorrência da fraude objeto da denúncia e/ou de outras similares constatadas na mesma época reforça a conclusão da ausência de elementos minimamente aptos a imputar-lhe a prática dolosa da conduta delituosa a ela imputada nesta ação penal. 18. Impõe-se, assim, a absolvição da Apelante Maria José da Silva Costa por não existir prova suficiente para a sua condenação criminal, nos termos do art. 386, inciso VII, do CPP. 19. Provimento das apelações para absolver os Apelantes da imputação criminal  contra eles deduzida na forma acima consignada.

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