ACR – 15198/SE – 0000066-50.2016.4.05.8501

RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL ROBERTO MACHADO -  

PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIMES AMBIENTAIS (ART. 55 DA LEI Nº 9.605/98 E ART. 2º DA LEI Nº 8.176/01). EXTRAÇÃO IRREGULAR DE AREIA. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA. CONFUSÃO COM O MÉRITO. REJEIÇÃO. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. MERA ALEGAÇÃO DE DIFICULDADES FINANCEIRAS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. QUANTUM MÍNIMO INDENIZATÓRIO (ART. 387, IV, DO CPP). MANUTENÇÃO. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. INDEFERIMENTO. APELAÇÃO IMPROVIDA. 01. Apelação interposta por AFCFN contra sentença que, julgando procedente o pedido formulado na denúncia, condenou o réu à pena privativa de liberdade de 01 (um) ano e 02 (dois) meses de detenção, a ser cumprida inicialmente em regime aberto, substituída por duas penas restritivas de direitos, além de 60 (sessenta) dias-multa no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época do fato, fixando o valor mínimo de indenização no montante de R$ 136.000,00 (cento e trinta e seis mil reais), pela prática dos crimes previstos no art. 55 da Lei nº 9.605/98 e art. 2º da Lei nº 8.176/01. 02. Os argumentos aduzidos pela defesa para sustentar a nulidade absoluta do processo, em razão da ilegitimidade passiva do recorrente, confundem-se, em verdade, com o próprio mérito recursal (autoria delitiva), razão pela qual deverão ser analisados em momento oportuno. Preliminar afastada. 03. A materialidade delitiva restou devidamente demonstrada, como se pode confirmar do Relatório de Fiscalização Ambiental de nº 10254/2015-3517 emitido pela ADEMA (fls. 122/126 do IPL), e do Laudo Pericial nº 501/2015 - STEC/SR/DPF/SE (fls. 105/113 do IPL), cujas conclusões foram corroboradas pelos depoimentos das testemunhas e pelas declarações do próprio acusado, em Juízo. O mencionado laudo não deixa qualquer dúvida quanto à ocorrência da degradação ambiental das áreas analisadas, descrevendo, minuciosamente, a espécie de atividade realizada, incluindo imagens e dados técnicos de demonstram a ocorrência da exploração indevida e do dano ambiental suportado. 04. Em relação à autoria delitiva, razão não assiste ao recorrente, uma vez que, como restou demonstrado na procuração constante à fl. 55 do IPL, a posição de FCFN como sócio gerente da empresa CANDEAL MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS LTDA - ME conferia-lhe perfeita cognição das atividades desempenhadas no polígono; além de ser apontado como responsável legal no requerimento de registro de licença junto ao Departamento Nacional de Produção Mineral (fl. 95 do IPL). 05. Não bastassem os argumentos expendidos na sentença, o réu, em seu interrogatório, em nenhum momento negou ter recebido valores depois do vencimento da licença, admitindo, inclusive, tê-los percebido, mesmo após a fiscalização (mídia digital de fl. 126). Adicionalmente, a autoria também se constata pela contraprestação da exploração auferida pelo apelante, como afirmado no depoimento da testemunha de acusação Aeliton Vieira Nascimento (mídia digital de fl. 142) e do depoimento de Edileuza Lima dos Santos (fl. 131/132 do IPL). 06. Evidencia-se, portanto, a percepção de valores e o irrefutável conhecimento do réu de que havia exploração mineral naquela área mesmo depois de vencida a licença, não se devendo falar na hipótese de não obtenção de proventos da exploração e da inexistência completa de vínculo jurídico-obrigacional entre as partes, mesmo porque a figura típica das imputações não exige a obtenção de vantagem para que haja o cometimento do crime, tampouco o seu exaurimento. 07. Perfeita subsunção ao crime imputado no art. 2º da Lei 8.176/91 pode ser observada no caso em tela, uma vez que, mesmo os depoentes na fase policial tendo afirmado que havia ordens para que se obstasse a extração (termo de declarações da testemunha Edileuza Lima Dos Santos às fls. 131/132 do IPL), durante a visita dos fiscais do IBAMA, a testemunha Ernesto José De Santana Neto (mídia digital de fl. 142, tempo 2`42``) ainda havia trabalhadores promovendo a retirada do material fora dos limites do polígono e com marretas e instrumentos rudimentares, o que comprova a adequação típica ao referido dispositivo. 08. Quanto à alegação de ausência de dolo, deve-se reconhecer a existência de elemento volitivo e consciente na prática da conduta típica, porque, como demonstrado ao longo do trâmite processual, o acusado recebia uma contraprestação e somente avisou aos trabalhadores do local no momento e que a licença havia vencido. 09. No que concerne à alegação de inexigibilidade de conduta diversa, os Tribunais Superiores firmaram sua jurisprudência no sentido de que é da defesa o ônus da prova quanto à causa supralegal de exclusão da culpabilidade. Precedente do STJ: AgRg no REsp 1264697/SP, Rel. Min. ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Sexta Turma, DJE 02/02/2016. Precedente do STF: APE 516/DF, Rel. Min. Ministro Ayres Britto, D20/09/2011. No caso, embora o recorrente tenha alegado, em seus depoimentos, que recebia sobre a exploração de matéria-prima em razão de dificuldades financeiras, não consta dos autos qualquer elemento probatório para corroborar essa tese. Além disso, conforme já decidiu o STJ, "a mera alegação de dificuldade financeira não justifica a prática delitiva" (AgRg no REsp 1.591.408/PR, Rel. Min. Sebastião Reis Junior, STJ - Sexta Turma, DJE 17/06/2016). Nessa toada, a mera alegação de dificuldades financeiras que impediram o réu de implementar o Plano de Recuperação de Áreas Degradas, não é capaz, por só, de subsidiar eventual diminuição da pena e, muito menos, isenção de culpa, porque nenhum traço se pode ser depreendido dos autos de que o réu passava por dificuldades financeiras contemporâneas ao delito. Precedentes: TRF5, ACR6667/PE, Terceira Turma, Relator Desembargador Federal Geraldo Apoliano, DJE: 20/03/2012; TRF5, ACR10367/PE, Quarta Turma, Desembargador Federal Rogério Fialho Moreira, DJe: 20/03/2014. 10. Por outro lado, a posterior restauração natural da flora não isenta o réu de culpa, tampouco tem o condão de atenuar sua pena, dado que o prejuízo ao mundo meio ambiente (resultado naturalístico) já se havia dado, levando à consumação do crime (como apurado no Laudo Pericial nº 501/2015 - STEC/SR/DPF/SE de fls. 105/113 do IPL e Relatório de Fiscalização Ambiental de nº 10254/2015-3517 da ADEMA às fls. 122/126 do IPL), sem que o réu tivesse tentado, ao menos, dirimir as suas consequências. 11. Quanto à indenização do art. 387, IV, do CPP, entende-se que o juiz poderá fixar valor mínimo para a reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido, desde que o crime tenha ocorrido após a entrada em vigor da Lei nº 11.719/2008 e o MPF tenha pedido expressamente a reparação (TRF5, ACR 00001271120164058500/SE, Primeira turma, Des. Fed. Élio Wanderley de Siqueira Filho, julgado em 10/07/2018; TRF5, ACR15409/AL, Primeira turma, Des. Fed. Élio Wanderley de Siqueira Filho, publicado no DJE 04/07/2018; STJ, AgRg no HC 319.241/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, julgado em 28/11/2017, DJe 01/12/2017). Na hipótese em tela, foi verificado o pedido no libelo (fl. 03), de modo que não deve prosperar a alegação de cerceamento do direito de defesa, porque tal pedido não foi combatido pelo réu em sede de resposta à acusação, tendo o magistrado somente aplicado o comando dado quando do julgamento dos Embargos de Declaração (fls. 213/215), não havendo que cogitar julgamento extra petita. 12. Relativamente à desproporcionalidade no valor da indenização, razão não assiste ao apelante, uma vez que, no Laudo nº 501/2015 - SETEC/SR/DPF/SE (fls. 105/113 do IPL) resta demonstrado que o cálculo da área de degradação foi mapeado por meio de GPS e, nessa aritmética já havia sido descontada a margem de erro do instrumento (cerca de 10%). Nessa ocasião, o referido Laudo atestou duas áreas em degradação fora do polígono autorizado na licença, quais sejam: uma de 400m² e outra de 5500m². Ainda nesse âmbito, o cálculo trazido no laudo leva em consideração as referidas áreas e o menor valor de mercado dos materiais explorados (minérios de classe 2) encontrado à época da sua elaboração, tendo como parâmetro a exploração de 3150m³, dados os descontos referentes à margem de erro do GPS e calculando-se de acordo com as diferentes profundidades verificadas nas áreas estudadas. Nesse sentido, apurou-se que a quantidade de areia retirada era de 945m³ enquanto que a de pedra 2205m³, dados que foram confrontados com as devidas cotações do material (R$ 42,75 por m³ de areia; R$ 54,36 m³ por m³ de pedra), perfazendo R$17.100,00 e R$119.863,80, respectivamente. Assim, merece fiabilidade o Laudo quando afirma o quantum mínimo indenizatório da ordem de R$ 136.963,80. 13. Não prospera o pedido de gratuidade da justiça, porque, conquanto haja certa presunção de veracidade da alegação feita pela pessoa natural, a análise objetiva da renda auferida pelo agravante não pode ser verificada de forma isolada, sem contextualizar com a sua realidade fática e as despesas dela decorrentes (EDAC532743/PE, TRF5, quarta turma, Desembargador Federal convocado Leonardo Augusto Nunes Coutinho, DJE 21/06/2018; PJe 08006994920184050000, TRF5, terceira turma, Desembargador Federal Carlos Rebêlo Júnior, julgamento em 30/05/2018). No caso em tela, o réu apenas alegou a insuficiência de recursos sem que houvesse efetivo embasamento do pedido (inclusive fazendo menção a documentos anexos que inexistem nos autos), sem conseguir demonstrar o atendimento dos pressupostos legais que autorizam a concessão do benefício. 14. Apelação improvida.

Para ler o documento na íntegra, clique aqui!

Comments are closed.