HABEAS CORPUS Nº 384.302 – TO (2016/0338185-5)

RELATOR : MINISTRO RIBEIRO DANTAS -  

Penal. Habeas corpus. Crime de frustração ou fraude ao caráter competitivo do procedimento licitatório (lei 8.666/1993, art. 90). Alegação de ausência de justa causa e inépcia da denúncia. Superveniência de sentença condenatória. Perda do objeto. Tipicidade do art. 90 da lei n. 8.666/1993. Dolo específico. Existência de elemento subjetivo do tipo. Intenção de obter para si ou para outrem a adjudicação do objeto licitado. Habeas corpus não conhecido. 1. Esta Corte e o Supremo Tribunal Federal pacificaram orientação no sentido de que não cabe habeas corpus substitutivo do recurso legalmente previsto para a hipótese, impondo-se o não conhecimento da impetração, salvo quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato judicial impugnado. 2. A jurisprudência desta Corte é segura no sentido que a superveniência de sentença condenatória torna prejudicado o pedido que buscava o trancamento da ação penal sob a alegação de falta de justa causa e inépcia da denúncia, haja vista a insubsistência do exame de cognição sumária, relativo ao recebimento da denúncia, em face da posterior sentença de cognição exauriente. Desse modo, não é possível apreciar os citados capítulos. 3. Cumpre esclarecer que a jurisprudência dos tribunais superiores admite o trancamento do inquérito policial ou de ação penal, excepcionalmente, nas hipóteses em que se constata, sem o revolvimento de matéria fático-probatória, a ausência de indícios de autoria e de prova da materialidade, a atipicidade da conduta ou a extinção da punibilidade, o que não se observa neste caso. 4. O crime do art. 90 da Lei n. 8.666/1993 é formal, ou de consumação antecipada, bastando a frustração do caráter competitivo do procedimento licitatório com o mero ajuste, combinação ou outro expediente, constatação que fulmina o argumento da necessidade de prejuízo ao erário, sendo este mero exaurimento do crime, elemento a ser valorado por ocasião da fixação da pena-base. 5. Advirta-se que sequer é possível invocar jurisprudência relativa ao crime de dispensa ou inexigibilidade ilegal de licitação (Lei n. 8.666/1993, art. 89, caput), haja vista ser dominante do Supremo Tribunal Federal o entendimento no sentido da desnecessidade da prova do dano ao erário, mas apenas o dolo específico de causar prejuízo ao erário. Ademais, o tipo do art. 89, parágrafo único, da Lei de Licitações, exceção à teoria monista, cria tipo autônomo para o terceiro diverso do agente público responsável pelo procedimento de dispensa ou inexigibilidade, que com ele concorre para irregular dispensa ou inexigibilidade, beneficiando-se. Perceba-se, pois, que é elemento descritivo do tipo o resultado material da dispensa ou inexigibilidade da licitação, que é a a efetiva adjudicação do objeto ao autor do crime descrito, ao contrário do crime da cabeça do artigo, cujo sujeito ativo é o agente público. 6. Os crimes do caput e do parágrafo único do art. 89 da Lei n. 8.666/1993, visto que distintos, possuem o elemento subjetivo comum de causar prejuízo ao erário por meio da dispensa ou inexigibilidade indevida, nos termos da jurisprudência dominante colacionada. Diversa é a situação do crime do art. 90 da referida Lei, cujo dolo específico exigido no elemento subjetivo do tipo é a intenção de obter, para si ou para outrem, vantagem decorrente da adjudicação, após frustrar ou fraudar o caráter competitivo do procedimento licitatório, por meio diverso do constante do crime do art. 89. Por conseguinte, o dolo específico exigido para o crime do art. 90 é a adjudicação do objeto licitado ou vantagem correlata, não necessariamente o dano ao erário, como prescreve a jurisprudência para o crime do art. 89, ambos, como se afirmou, da Lei n. 8.666/1993. 7. No caso concreto, houve inadequação da modalidade licitatória convite, haja vista a superação do limite imposto pelo art. 23, I, "a", da Lei n. 8.666/1993. Outrossim, além de utilizar-se indevidamente de modalidade cuja competitividade é mais restrita, dentre os três participantes convidados, constavam o paciente e seu pai, que presentavam sociedades empresárias formalmente distintas, malgrado utilizassem o mesmo nome fantasia "Mundo dos Ferros". Analisando o arcabouço fático correlato, as instâncias ordinárias concluíram pela existência de ajuste e combinação fraudulenta apta a frustrar o caráter competitivo da licitação, conclusão esta que não pode ser alterada nesta via restrita do habeas corpus, sob pena de indevido revolvimento fático probatório. Por fim, o dolo específico do tipo do art. 90 da Lei n. 8.666/1993 restou demonstrado, pois patente a intenção de obter para outrem, o pai do paciente, a adjudicação do objeto licitado, o que efetivamente ocorreu no caso, alcançando o exaurimento do crime. 8. Habeas corpus não conhecido.

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