Os Intervalos Lúcidos

Antônio José Eça -

Alguns amigos, incluindo meu editor, têm pedido para que falemos alguma coisa também sobre outras áreas da Psiquiatria Forense, já que não é apenas de “crimes” e “medidas de segurança” que vive um operador da Psicopatologia Forense e do Direito. Com este artigo, pretendemos começar a falar um pouco sobre as outras áreas de atuação do psiquiatra forense, onde ele pode também ajudar ao Direito na elucidação dos fatos médicos, fora do Direito Penal. 

 Entender sobre os chamados “intervalos lúcidos”, é um tema fascinante também, pois permitem a discussão sobre a etiologia e principalmente o desenvolvimento da doença mental e suas consequências para o Direito Civil.

Assim é que os “intervalos lúcidos”, como o próprio nome diz, são aqueles intervalos que podem existir entre os surtos de uma eventual doença. E porque eles são importantes? Pelo fato de que, em se tratando de uma doença mental, podem ser os responsáveis, tanto pela interdição de um paciente, como pela não interdição do mesmo. Tal diferença vai ser importante em face de que com isto, pode-se decidir a vida de um indivíduo e de seus familiares e de seus bens.

Na maioria dos casos, será discutida a existência de um intervalo lúcido no caso da hoje conhecida como “distúrbio bipolar”, (outrora a psicose maníaco depressiva).

Muito bem, vamos discuti-lo: o paciente apresenta o tal distúrbio bipolar; tem suas crises, se trata, e (importante dizer), como esta é uma das psicoses que tem um prognóstico bom, vai voltar à sua vida normal. Achamos importante ressaltar o prognóstico em termos de aproveitamento da vida, porque outras psicoses podem “invalidar” muito mais o paciente, por assim dizer; mas esta não, o mais comum é que os pacientes voltem a suas vidas normais depois de uma crise, de uma fase da doença.

Mas, a família pode ficar preocupada, pois na fase “maníaca” da doença, (que se caracteriza por alegria patológica e principalmente prodigalidade), pode acontecer de o paciente pretender (e às vezes conseguir) dilapidar bens e direitos, dando um grande trabalho para a família desfazer tal atitude.

Antes de interditá-lo, será imposto o estudo do chamado “intervalo lúcido”, que é em verdade, o intervalo de lucidez que o paciente pode apresentar entre uma crise e outra.

Ai é que entra o conhecimento da história clínica do doente e o conhecimento de psicopatologia que o técnico deve possuir: da análise do encaminhamento que a doença possui se poderá concluir pela interdição ou não do paciente.

Assim é que, por exemplo, um paciente A tem fases da doença espaçadas de dois anos entre as crises, e permanece nesta crise por cerca de uma semana; por sua vez, o paciente B, tem fases graves da doença, espaçadas de um mês entre as crises, mas permanece cerca de cinco meses nas crises.

Ora, percebe-se que o primeiro paciente tem sua doença muito mais branda do que o segundo, já que mal tem crises pequenas, e estas duram pouco tempo; já o segundo, pobre coitado, tem crises muito longas e intervalos entre as mesmas muito pequenos. Se tivermos que pensar em qual deles está mais perigoso no sentido de vir a dilapidar bens e cause com isto transtornos familiares para a resolução de tais pendências, claro está que o segundo deles corre muito mais tal risco.

Então, o conhecimento da envergadura do intervalo de lucidez que o paciente apresente é que vai orientar a atitude jurídica que se deverá tomar em relação ao mesmo; é importante frisar que não devemos nos prender ao “nome” do diagnóstico do paciente, pois o simples fato de apresentar um “distúrbio bipolar” não quer dizer obrigatoriamente que tudo esta acabado para o paciente, em termos de capacidade civil.

Mais importante é conhecer a envergadura, a gravidade e a duração de sua doença para depois se opinar sobre sua interdição ao não.

É isso.

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