APELAÇÃO CRIMINAL N. 0005619-84.2013.4.01.3816/MG

RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL NÉVITON GUEDES -  

PENAL. PROCESSO PENAL. CRIME DO ARTIGO 89 DA LEI 8666/93. DISPENSA DE LICITAÇÃO FORA DAS HIPÓTESES PREVISTAS EM LEI. AUSÊNCIA DE PROVAS DO DOLO ESPECÍFICO DE CAUSAR DANO À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DE EFETIVO DANO AO ERÁRIO. ABSOLVIÇÃO. APELAÇÃO PROVIDA. 1. Apelação interposta por Ernandes Fernando Batista contra a sentença que o condenou a 03 (três) anos e 02 (dois) meses de detenção pela prática do crime capitulado no art. 89 da Lei nº 8.666/1993. 2. Consta da denúncia que o réu, então prefeito da cidade de Itaipé/MG, no ano de 2008, deixou de realizar processo licitatório para aquisição de materiais odontológicos, tendo, a Controladoria Geral da União (CGU), por intermédio do Relatório de Fiscalização n. 01390, referente ao 28° Evento do Projeto de Fiscalização a partir de sorteios, Município de Itaipé/MG, entre os dias 13/10 A 23/12 de 2009, constatou a inexistência de processo licitatório n. 07/2008, modalidade Convite, tendo como objeto a aquisição de material odontológico. 3. Na sentença, o magistrado entendeu que restou comprovada a materialidade e autoria do delito do art. 89 da Lei nº 8.666/93, pelo Relatório de Fiscalização n. 01390, de 12/05/2009 (fls. 12/94), no qual consta que o réu adquiriu materiais odontológicos em 2008, sem processo licitatório, havendo um prejuízo ao erário de R$ 9.679,26. 4. A sentença merece reforma. O tipo previsto no art. 89 da Lei de Licitações não prevê modalidade culposa e requer, também, prova da vontade do agente específica de dispensar o certame como forma de causar dano ao erário público, favorecendo terceiros (no caso do contratado, a si mesmo). Portanto, esse delito exige a presença de dolo específico, ou seja, a deliberada intenção do réu em causar prejuízo ou mesmo obter algum favorecimento pessoal. 5. Nesse sentido, “a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que, para a caracterização da conduta tipificada no art. 89 da Lei 8.666/1993, é indispensável a demonstração, já na fase de recebimento da denúncia, do ‘elemento subjetivo consistente na intenção de causar dano ao erário ou obter vantagem indevida’ (INQ 2.688, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, Rel. p/ acórdão Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, DJe de 12.2.2015). No caso, pelo que se colhe dos autos é possível se afirmar, desde logo, que não se encontra presente essa circunstância volitiva, o que revela a atipicidade, determina inclusive a improcedência da acusação, nos termos do art. 6º, 2º parte, da Lei 8.038/1990” (Inq 3965, Rel. Min. Teori Zavascki, Segunda Turma, DJe-259 05-12-2016). 6. No caso, a acusação não se desincumbiu do ônus de demonstrar o dolo específico exigido, ou seja, que o réu, na qualidade de prefeito, agiu com a deliberada intenção de causar prejuízo ao erário ou de obter algum favorecimento pessoal. Ademais, não há provas de que a contratação de produtos e serviços acima do limite legal de dispensa ou inexigibilidade de licitação gerou desvio de verbas, a concessões de privilégios indevidos ou situação de inadimplência ao município, devendo-se considerar ainda a demonstração de que, no município, existia apenas um posto de combustível. 7. Portanto, da análise do acervo probatório, verifica-se que não ficou demonstrada a presença do dolo específico, qual seja, a vontade livre e conscientemente dirigida a causar dano ao erário por meio do afastamento do procedimento licitatório; nem o próprio prejuízo ao ente público, pois não houve prova de superfaturamento dos preços cobrados. Diante disso, a absolvição por ausência de provas suficientes para uma condenação é medida que se impõe. 8. O Ministério Púbico Federal, com assento neste Tribunal, opina pelo provimento da apelação para que seja o réu absolvido. 9. Apelação provida para absolver o réu da imputação da prática do delito do art. 89 da Lei nº 8.666/93, na forma do art. 386, VI, do CPP.

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