Relator Expõe Detalhes Da Participação De Virgílio Medina No Esquema De Vendas De Liminares

O relator do Inquérito 2424, ministro Cezar Peluso, reconheceu indícios da participação do advogado Virgílio Medina no esquema de venda de decisões judiciais que favoreciam empresários de jogos ilegais no Rio de Janeiro, deflagrado em 2006. “Ele cuidava de solicitar e receber vantagens indevidas para que o irmão proferisse decisões favoráveis”, explicou.

O voto de Peluso foi pelo recebimento da denúncia contra Virgílio no crime de corrupção passiva em concurso de pessoas. Ele foi acompanhado pelos ministros Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Eros Grau, Carlos Ayres Britto, Celso de Mello e Gilmar Mendes.

O ministro Marco Aurélio foi o voto contrário. Ele rejeitou o recebimento da denúncia alegando que Virgílio já está sendo processado por corrupção na primeira instância da Justiça e, portanto, não deve ser julgado pelo STF sob risco de dupla imputação para os mesmos fatos.

Histórico

No seu voto, Peluso detalhou o funcionamento da organização criminosa montada pelos empresários donos de bingo e máquinas caça-níqueis para comprar decisões judiciais favoráveis a eles.

Em abril de 2006 houve o cumprimento de mandados de busca de máquinas de caça-níqueis. Algumas empresas do setor se reuniram e impetraram mandado de segurança no Tribunal Regional Federal da 2ª Região para anular as apreensões. O desembargador indeferiu o mandado.

Os empresários passaram, então, a articular com seus lobistas e advogados a adoção das medidas necessárias para ter as máquinas funcionando novamente – mesmo que isso implicasse a compra de liminares judiciais.

O genro do magistrado Carreira Alvim, vice-presidente do mesmo tribunal, teria negociado duas liminares cujos valores negociados seriam de R$ 1 milhão e R$ 150 mil, pagos para que ele liberasse as máquinas. Em um dos casos, ele garantia a liberação caso, no futuro, houvesse uma nova apreensão das máquinas.

Isso chamou a atenção do Ministério Público, que impetrou um mandado de segurança e teve a liminar deferida pelo presidente do mesmo TRF-2.

Como resposta, as empresas de caça-níqueis ajuizaram, no Superior Tribunal de Justiça, uma Reclamação (RCL 2211) contra a decisão do presidente do TRF-2. Na análise da liminar, o ministro do STJ Paulo Medina restabeleceu a decisão de Carreira Alvim, de devolução das máquinas aos empresários.

Conversas telefônicas gravadas sem o conhecimento do ministro teriam revelado que ele negociou a decisão em troca de dinheiro, por meio do irmão, o advogado Virgílio Medina. No início, Virgílio teria pedido R$ 600 mil para atuar como intermediário de uma decisão de interesse das empresas de jogos. “Os áudios mostram que o valor foi pago prontamente e aumentado para R$ 1 milhão para que dois intermediários do grupo recebessem comissões”, informou Peluso.

Paulo Lino, presidente da associação das empresas de jogos, resolveu negociar diretamente com Virgílio e o valor voltou aos R$ 600 mil, segundo relatou o ministro Peluso em seu voto.

No dia 15 de agosto de 2006, Paulo Medina deferiu liminar para que as máquinas fossem liberadas, seguindo o julgamento de Carreira Alvim. No entanto, ele praticamente não se preocupou em justificar por que teria decidido dessa forma. Na opinião do ministro relator do processo no STF, foi “uma fundamentação lacônica”.

“O magistrado justificou a liberação das máquinas alegando prejuízo econômico para os donos”, disse Peluso.

Para ele, as escutas ambientais e as provas dão indícios de fraude na decisão de Medina. Em um dos trechos captados pelos equipamentos, ouviu-se: “Eles estão cobrando um valor por máquina para ajudar a pagar a liminar que eles tiraram.”

No entanto, houve uma cisão dos corruptores da organização criminosa que brigavam por comissões. Ao mesmo tempo, o Ministério Público Federal começava a agir: ingressou no STF com pedido de suspensão da liminar de Paulo Medina. A decisão do ministro do STJ foi, de fato, cassada pela ministra do STF Ellen Gracie que deferiu a liminar, como havia pedido o Ministério Público.

Os advogados das empresas de jogos argumentaram, no entanto, que o caso não era da competência do Supremo e voltaram a apostar no STJ. Voltaram a procurar Virgílio Medina para que ele garantisse que, ao julgar o mérito da reclamação, Paulo Medina sustentasse a mesma posição que teve na decisão da liminar.

Contudo, o valor pedido pelo irmão de Paulo Medina era alto para o grupo. “Foi muito além do que o grupo suportaria ou desejava pagar por uma decisão que talvez não se sustentasse com os outros ministros [porque, naquele momento, o julgamento seria colegiado]”, explica Peluso.

O voto de Paulo Medina pelo indeferimento da reclamação do MP, em 22 de novembro de 2006, foi acompanhado dos demais ministros. Era a derrota dos empresários do bingo. O relator informou que num diálogo entre um lobista e uma advogada da organização captado no aeroporto de Brasília, eles sugeriram que o julgamento do STJ teria sido motivado porque os magistrados saberiam que a decisão poderia ter sido negociada.

MG/LF

No Comments Yet.

Leave a comment