Conflito De Competência Nº 90.131/mg

Disparo de arma de fogo em via pública. Art. 15 da Lei10.826/03. Policial militar que atira no pneu de caminhão para evitar a fuga de possível infrator. Crime que não encontra correspondência no código penal militar. Competência da Justiça Militar afastada. Competência do juízo suscitante.

Rel. Min. Maria Thereza De Assis Moura


RELATÓRIO - MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA (Relatora):
Trata-se de conflito negativo de competência suscitado pelo JUÍZO DA 2ª AUDITORIA DA JUSTIÇA MILITAR DE BELO HORIZONTE - MG em face do JUÍZO DE DIREITO DA VARA CRIMINAL DE INQUÉRITOS POLICIAIS DE BELO HORIZONTE - MG. Depreende-se dos autos que foi instaurado inquérito policial com o fim de se investigar o conduta do Policial Militar Barnabé Fortunato Maia, que teria supostamente praticado o crime de disparo de arma de fogo em via pública, previsto no artigo 15 da Lei 10.826/03 no exercício de sua atividade profissional. De acordo com o relatório da autoridade policial, assim se deram os fatos: “(...) Foi noticiado nos autos que o motorista do caminhão teria descido do veículo com uma barra de ferro, com a intenção de agredir o irmão de Barnabé, identificado como José Geraldo Maia, também policial militar. Ao ser avisado de tal fato, Barnabé interveio, anunciou ser policial militar, identificou-se e ordenou que Cássio Guimarães e também os demais funcionários que o acompanhavam se identificassem. Barnabé e seu irmão José Geraldo, bem como a testemunha José Roberto do Carmo noticiaram que Cássio teria respondido que 'polícia é bosta' e desobedeceu a ordem dada por Barnabé enquanto policial. A testemunha José Roberto do Carmo ainda disse ter visto Cássio 'arrancar' o caminhão e tentar sair do local, quase atingindo Barnabé, momento em que ele teria efetuado dois disparos de arma de fogo, para impedir a retirada do caminhão daquele local. (...) Pelo que restou apurado dos autos o policial Barnabé sacou sua arma e efetuou disparos apenas no intuito de impedir que Cássio Guimarães retirasse o caminhão do local. Após efetuar os disparos, segundo suas declarações, o próprio Barnabé acionou apoio policial. (...)“. O Juízo da Vara Criminal de Inquéritos Policiais de Belo Horizonte - MG, à fl. 33, entendeu que a competência para conhecer e julgar a questão cabe à Justiça Militar Estadual. Dessa forma, declinou da competência, remetendo os autos à Justiça Militar, como consta à fl. 36. Acolheu, para tanto, manifestação do Ministério Público do Estado Minas Gerais, assim lançada: “Noticiam os autos a prática, em tese, de delito de disparo de arma de fogo, de que teria sido autor o policial militar Barnabé Fortunato Maia. Ante a possibilidade do estrito cumprimento do dever legal, temos que devam os presentes autos serem submetidos à Auditoria Militar, para as providências cabíveis“. Remetidos os autos à Justiça Militar, o Ministério Público do Estado de Minas Gerais, às fls. 42/43, tendo em vista a co-autoria, e que a conduta dos civis não havia sido apreciada pela Justiça Comum, requereu que “o feito fosse 'xerocopiado' e remetido à Justiça Comum para apreciação das condutas dos civis em tela“, bem como pugnou pela verificação acerca da apuração dos fatos pela Justiça Militar em sede de inquérito policial militar. Atendidos os requerimentos do Ministério Público, foi remetida cópia dos autos à Justiça Comum (fl. 44), bem como determinada a instauração de inquérito policial militar (fl.47), sendo que, à fl.48, foi informado que “os fatos em questão já foram apurados por meio da Sindicância Regular de Portaria n.º 3520.0/06-13º BPM, cuja cópia segue juntada [...] às fls. 49 a 227“. Destarte, após verificar o conteúdo da mencionada Sindicância Regular, o Ministério Público, às fls. 232/233, alegou que o fato discutido nos autos “não se adeqüa ao art. 9º do Código Penal Militar, pois não fere a autoridade e a disciplina militar e, consequentemente, a administração e a instituição militar a que o Direito Penal Militar se propõe a preservar“, razão pela qual interpôs exceção de incompetência. O Juízo Militar, acolhendo a tese do Ministério Público houve por bem suscitar o presente conflito de competência à esta Corte Superior de Justiça, verbis : “Razão assiste ao órgão do Ministério Público. A conduta atribuída ao policial militar BARNABÉ FORTUNATO MAIA não encontra correspondência nas hipóteses do artigo 9º do CPM, para a caracterização de delito militar, pelo que não compete à Justiça Militar Estadual conhecer de eventual processo quanto ao aqui constante. Destarte, instaurando o conflito negativo de competência, à vista do contido no artigo 11 e seguintes do CPPM e artigo 105, alínea 'd', da Constitutição Federal, sirvo-se deste para representar ao egrégio Superior Tribunal de Justiça, para dirimir o presente conflito negativo de competência.“ O Ministério Público Federal opinou pela declaração da competência da Justiça comum, em parecer de fls. 240, assim ementado: “PROCESSUAL PENAL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. DISPARO DE ARMA DE FOGO. CONDUTA ATRIBUÍDA A POLICIAL MILITAR, MAS NÃO CARACTERIZADA COMO CRIME MILITAR, POR NÃO SE ENQUADRAR NAS HIPÓTESES DO ART. 9º DO CÓDIGO PENAL MILITAR. CRIME DESCRITO NA LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL. Conflito estabelecido entre Juízo de Direito da Justiça Comum Estadual, suscitado pelo primeiro em decorrência da exceção de incompetência oposta pelo MP. Não obstante a condição de policial militar do investigado e a possibilidade de ter agido no exercício de suas atribuições, esses elementos, por si sós, não têm o condão de atribuir competência jurisdicional à Justiça castrense, pois é necessária a existência de previsão legal do fato como crime militar. - Assim, como o delito de disparo de arma de fogo é previsto em legislação penal especial e não possui correlação com os tipos descritos no CPM, a teor do disposto no art. 9º e incisos do referido código, a competência para conhecer de eventual processo relativo aos fatos é da Justiça Comum. - Parecer pela procedência do conflito, declarando-se competente o juízo comum estadual suscitado.“ É o relatório.

 
VOTO - MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA (Relatora):
Verifica-se, da análise atenta do artigo 9º do Código Penal Militar, que apenas caracterizam crimes militares, em tempo de paz, aquelas condutas que, além de se enquadrarem nas hipóteses nele previstas, estejam ainda contempladas como crime no corpo do Código Penal Militar: Art. 9º Consideram-se crimes militares, em tempo de paz: I - os crimes de que trata este Código, quando definidos de modo diverso na lei penal comum, ou nela não previstos, qualquer que seja o agente, salvo disposição especial; II - os crimes previstos neste Código, embora também o sejam com igual definição na lei penal comum, quando praticados: a) por militar em situação de atividade ou assemelhado, contra militar na mesma situação ou assemelhado; b) por militar em situação de atividade ou assemelhado, em lugar sujeito à administração militar, contra militar da reserva, ou reformado, ou assemelhado, ou civil; c) por militar em serviço ou atuando em razão da função, em comissão de natureza militar, ou em formatura, ainda que fora do lugar sujeito à administração militar contra militar da reserva, ou reformado, ou civil; (Redação dada pela Lei nº 9.299, de 8.8.1996) d) por militar durante o período de manobras ou exercício, contra militar da reserva, ou reformado, ou assemelhado, ou civil; e) por militar em situação de atividade, ou assemelhado, contra o patrimônio sob a administração militar, ou a ordem administrativa militar; f) revogada. (Vide Lei nº 9.299, de 8.8.1996) III - os crimes praticados por militar da reserva, ou reformado, ou por civil, contra as instituições militares, considerando-se como tais não só os compreendidos no inciso I, como os do inciso II, nos seguintes casos: a) contra o patrimônio sob a administração militar, ou contra a ordem administrativa militar; b) em lugar sujeito à administração militar contra militar em situação de atividade ou assemelhado, ou contra funcionário de Ministério militar ou da Justiça Militar, no exercício de função inerente ao seu cargo; c) contra militar em formatura, ou durante o período de prontidão, vigilância, observação, exploração, exercício, acampamento, acantonamento ou manobras; d) ainda que fora do lugar sujeito à administração militar, contra militar em função de natureza militar, ou no desempenho de serviço de vigilância, garantia e preservação da ordem pública, administrativa ou judiciária, quando legalmente requisitado para aquele fim, ou em obediência a determinação legal superior.“ Todavia, a infração que se pretende atribuir ao policial militar Barnabé Fortunato Maia, de disparo de arma de fogo em via pública, apenas encontra previsão legal no Estatuto do Desarmamento, em seu artigo 15, com a seguinte redação: Art. 15. Disparar arma de fogo ou acionar munição em lugar habitado ou em suas adjacências, em via pública ou em direção a ela, desde que essa conduta não tenha como finalidade a prática de outro crime: Não há correspondência com qualquer outro tipo penal previsto no Código Penal Militar, ainda que sob outra definição. Desta forma, afasta-se a competência por parte da Justiça Militar para a apreciação da conduta em questão. Como bem ressaltado pelo Ministério Público Federal em seu parecer: “Assiste razão ao juízo suscitante. O artigo 124 da CR estabelece a competência da Justiça Militar para o processamento e julgamento de crimes militares assim definidos em lei. Ocorre, no entanto, que o delito de disparo de arma de fogo está tipificado apenas na legislação penal especial, não havendo correlação com os tipos descritos no CPM, a teor do art. 9º do referido código. Verifica-se, portanto, que, não obstante a condição de policial militar do investigado e a possibilidade de ter agido no exercício de sua profissão, esse elementos, por si sós, não têm o condão de atribuir competência jurisdicional à Justiça castrense, pois, para tanto, é imprescindível a existência de previsão legal do fato como crime militar. Assim, a competência para conhecer de eventual processo relativo aos fatos em apreço é da justiça comum estadual.“ Assim, entendo que a competência para a apreciação de eventual denúncia, deve ser da Justiça Comum, a quem competirá, ademais, verificar a ocorrência, no caso, de tipicidade do fato, assim como outros elementos excludentes de antijuridicidade (estrito cumprimento de dever legal, por exemplo). Ante o exposto, conheço do presente conflito para declarar a competência do juízo de Direito da Vara Criminal de Inquéritos Policiais de Belo Horizonte/MG, suscitado, para conhecer de eventual denúncia oferecida contra o investigado Barnabé Fortunato Maia e processá-lo e julgá-lo se for o caso. É como voto.

 
EMENTA -
CONFLITO DE COMPETÊNCIA. 1. DISPARO DE ARMA DE FOGO EM VIA PÚBLICA. ART. 15 DA LEI 10.826/03. POLICIAL MILITAR QUE ATIRA NO PNEU DO CARRO DE CAMINHÃO PARA EVITAR A FUGA DE POSSÍVEL INFRATOR. CRIME QUE NÃO ENCONTRA CORRESPONDÊNCIA NO CÓDIGO PENAL MILITAR. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA MILITAR AFASTADA. 2. COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITANTE. 1. Tratando-se da conduta de efetuar disparos de arma de fogo em via pública, cometida por policial militar em situação de atividade, crime que não encontra correspondente previsão legal no Código Penal Militar, é de se afastar a competência da Justiça castrense. 2. Reconhecida a competência do juízo de Direito da Vara Criminal de Inquéritos Policiais de Belo Horizonte/MG, suscitado, para conhecer de eventual denúncia oferecida contra o investigado e processá-lo e julgá-lo se for o caso.

ACÓRDÃO -
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça: A Seção, por unanimidade, conheceu do conflito e declarou competente o Suscitado, Juízo de Direito da Vara Criminal de Inquéritos Policiais de Belo Horizonte - MG, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Votaram com a Relatora os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Jorge Mussi, Jane Silva (Desembargadora convocada do TJ/MG), Felix Fischer, Paulo Gallotti, Laurita Vaz e Arnaldo Esteves Lima. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Nilson Naves. Brasília, 27 de fevereiro de 2008 (Data do Julgamento)

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