Recurso Especial Nº 897.823/pr

Crime de responsabilidade de Prefeito. Inabilitação para o exercício de cargo ou função pública. Pena autônoma em relação à pena privativa de liberdade. Prescrição. Prazos distintos.

Rel. Min. Félix Fischer


RELATÓRIO - O EXMO. SR. MINISTRO FELIX FISCHER:
Trata de recurso especial interposto pelo Ministério Público, com fundamento no art. 105, III, alíneas a e c, da Lex Fundamentalis, em face de v. acórdão prolatado pela c. Sexta Câmara Criminal do e. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, na apelação nº 284.718-1. Esta a ementa do v. julgado: “APELAÇÃO CRIMINAL. - CRIME DE RESPONSABILIDADE. - LAPSO TEMPORAL ENTRE A DATA DO FATO E O RECEBIMENTO DA DENÚNCIA SUPERIOR A 04 (QUATRO) ANOS. - OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO RETROATIVA DA PRETENSÃO PUNITIVA. - RECONHECIMENTO DE OFÍCIO. - RECURSO EM SEU MÉRITO PREJUDICADO. I. Foi o recorrente condenado pela prática do crime capitulado no artigo 1º, inciso XIII, do Decreto-Lei 201/67, tendo-lhe sido imposta a pena de 01 (hum) ano e 03 (três) meses de detenção. II. Consoante disposto no artigo 109, inciso V do Código Penal, o prazo prescricional para o presente caso é de 04 (quatro) anos e computando-se o lapso temporal entre a data do fato (01/02/1.998) e o recebimento da denúncia (13/08/2.002), tem-se que, ultrapassado o referido prazo, ocorre portanto a prescrição retroativa da pretensão punitiva“ (fl. 285). Daí o presente apelo nobre, no qual sustenta o Parquet, a par de dissídio jurisprudencial, que o r. decisum, violou o art. 1°, § 2°, do Decreto Lei n° 201/67, uma vez que a inabilitação para o exercício de cargo ou função pública possui natureza jurídica de pena autônoma, portanto, a prescrição da pena privativa de liberdade não a alcançaria. Contra-razões às fls. 349/360. Admitidos na origem, os autos subiram a esta Corte (fls. 362/364). A douta Subprocuradoria-Geral da República, às fls. 442/447, se manifestou pelo provimento do recurso em parecer assim ementado: “EMENTA. RECURSO ESPECIAL. PENAL. CRIME DE RESPONSABILIDADE DE PREFEITO. INABILITAÇÃO PARA O EXERCÍCIO DE CARGO OU FUNÇÃO PÚBLICA. PENA AUTÔNOMA EM RELAÇÃO À PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. PRESCRIÇÃO. PRAZOS DISTINTOS. ART. 1°, §2°, DO DECRETO-LEI N° 201/67. VIOLAÇÃO. DISSÍDIO COMPROVADO. PELO CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO RECURSO. 1) Viola o art. 1°, §2°, do Decreto-lei 201/67, a decisão que interpreta a pena de inabilitação como sendo acessória da privativa de liberdade, uma vez que, segundo precedentes do STF e do STJ, “a pena de inabilitação para o exercício de função pública é autônoma em relação à pena privativa de liberdade. Logo, tratando-se de penas de naturezas jurídicas diversas, distintos, também, serão os prazos prescricionais, i.e., não sendo a pena de inabilitação acessória da pena privativa de liberdade, cada uma prescreve a seu tempo“ 2) Dissídio comprovado nos termos dos arts. 541, parágrafo único, do CPC, e 255, §§ 1° e 2°, do RISTJ. 3) Pelo conhecimento e provimento do recurso especial pelas alíneas “a“ e “c““ (fl. 442). É o relatório.

 
VOTO -
O EXMO. SR. MINISTRO FELIX FISCHER: A controvérsia gira em torno da pena de inabilitação para o exercício de cargo ou função pública (art. 1º, §2º, do Decreto-Lei nº 201/67), i.e., se esta seria pena acessória ou autônoma. Na primeira hipótese a prescrição da pena acessória se daria no mesmo prazo da principal; já na segunda, os lapsos temporais seriam distintos. Tenho que razão assiste ao recorrente. De fato, a pena de inabilitação para o exercício de função pública é autônoma em relação à pena privativa de liberdade. Logo, tratando-se de penas de naturezas jurídicas diversas, distintos, também, serão os prazos prescricionais. Vale dizer, não sendo a pena de inabilitação acessória da pena privativa de liberdade, cada uma prescreve a seu tempo. Nesse sentido o seguinte precedente do Pretório Excelso: “PROCESSUAL PENAL. QUESTÃO DE ORDEM. PEDIDO DE RECONHECIMENTO DE OFÍCIO DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DA PENA IN CONCRETO. CRIME DE RESPONSABILIDADE DE PREFEITO MUNICIPAL AO QUAL FORAM COMINADAS AS PENAS DE MULTA E DE INABILITAÇÃO PARA EXERCÍCIO DE CARGO OU FUNÇÃO PÚBLICA. Reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva do réu em relação à pena de multa aplicada, que se tornou definitiva ante a inexistência de recurso da acusação. Hipótese, entretanto, em que o processo deve prosseguir em face da pena restritiva de direito cominada que, por possuir natureza independente e autônoma em relação à pena de multa, prescreve a seu tempo, não sendo alcançada pela prescrição desta. Questão de ordem que se resolve na forma acima explicitada.“ (AI 379392 QO/SP, 1ª Turma, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJU de 16/08/2002). E desta Corte: “CRIMINAL. RESP. CRIME DE RESPONSABILIDADE DE PREFEITO. PRESCRIÇÃO RETROATIVA DA INABILITAÇÃO PARA O EXERCÍCIO DE CARGO OU FUNÇÃO PÚBLICA. NATUREZA JURÍDICA DIVERSA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE NÃO CARACTERIZADA. RECURSO PROVIDO. Hipótese em que o recorrido restou condenado, por crime de responsabilidade, à pena privativa de liberdade e à inabilitação para o exercício de cargo ou função pública, tendo sido decretada a extinção da punibilidade de ambas as punições. A inabilitação para o exercício de função pública foi elevada ao status de pena restritiva de direitos, sendo autônoma em relação à privativa de liberdade. Tratando-se de penas de naturezas jurídicas diversas, distintos serão os prazos prescricionais. Precedente do STF e do STJ. Recurso que merece ser provido para cassar o acórdão recorrido na parte em que reconheceu a prescrição da pena de inabilitação para o exercício de cargo público. Recurso conhecido e provido, nos termos do voto do relator.“ (REsp 784.680/SC, 5ª Turma, Rel. Ministro Gilson Dipp, DJU de 02/05/2006). “PENAL. RECURSO ESPECIAL. CRIME DE RESPONSABILIDADE DE PREFEITO. INABILITAÇÃO PARA O EXERCÍCIO DE CARGO OU FUNÇÃO PÚBLICA. PENA AUTÔNOMA EM RELAÇÃO À PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. PRESCRIÇÃO. PRAZOS DISTINTOS. A pena de inabilitação para o exercício de função pública é autônoma em relação à pena privativa de liberdade. Logo, tratando-se de penas de naturezas jurídicas diversas, distintos, também, serão os prazos prescricionais, i.e., não sendo a pena de inabilitação acessória da pena privativa de liberdade, cada uma prescreve a seu tempo (Precedentes do STF e do STJ). Recurso provido.“ (REsp 738.891/PR, 5ª Turma, de minha relatoria, DJU de 19/12/2005). “RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSO PENAL. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL ALÍNEA C DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL. ART. 1º, INCISO II DO DECRETO-LEI 201/67. INABILITAÇÃO PARA O EXERCÍCIO DE CARGO PÚBLICO. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. “O Pretório Excelso, em situação semelhante, concluiu não ser a pena de inabilitação acessória da pena privativa de liberdade, por possuir natureza independente, prescrevendo, assim, cada qual a seu tempo.“ Recurso conhecido e provido.“ (REsp 620958/SC, 5ª Turma, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJU de 06/09/2004). Ante o exposto, dou provimento ao recurso, a fim de reconhecer a autonomia da pena de inabilitação para o exercício de função pública em relação à pena privativa de liberdade, determinando, por conseguinte, a remessa dos autos ao e. Tribunal de origem para que examine os pontos levantados pela defesa no recurso de apelação. É o voto.

 
EMENTA -
PENAL. RECURSO ESPECIAL. CRIME DE RESPONSABILIDADE DE PREFEITO. INABILITAÇÃO PARA O EXERCÍCIO DE CARGO OU FUNÇÃO PÚBLICA. PENA AUTÔNOMA EM RELAÇÃO À PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. PRESCRIÇÃO. PRAZOS DISTINTOS. A pena de inabilitação para o exercício de função pública é autônoma em relação à pena privativa de liberdade. Logo, tratando-se de penas de naturezas jurídicas diversas, distintos, também, serão os prazos prescricionais, i.e., não sendo a pena de inabilitação acessória da pena privativa de liberdade, cada uma prescreve a seu tempo (Precedentes do STF e do STJ). Recurso provido.

 
ACÓRDÃO -
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Laurita Vaz, Arnaldo Esteves Lima, Napoleão Nunes Maia Filho e Jane Silva (Desembargadora convocada do TJ/MG) votaram com o Sr. Ministro Relator. Brasília, 30 de agosto de 2007. (Data do Julgamento).

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