REVISÃO CRIMINAL Nº 0003834-93.2017.4.03.0000/MS

RELATOR: DESEMBARGADOR FAUSTO DE SANCTIS -  

REVISÃO CRIMINAL. PROTEÇÃO À COISA JULGADA E HIPÓTESES DE CABIMENTO. CASO CONCRETO. PEDIDO DE RECONHECIMENTO DA AUSÊNCIA DE PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS ELENCADOS NO ART. 41 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - SUPOSTA "SELETIVIDADE" DO ÓRGÃO ACUSATÓRIO MOTIVADA POR "VINDICTA POLÍTICO PARTIDÁRIA PAROQUIANA". PEDIDO DE ASSENTAMENTO DO CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA DO REVISIONANDO ANTE A NÃO REALIZAÇÃO DE PERÍCIA IN LOCO. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO FUNDADO NA AUSÊNCIA DE ENRIQUECIMENTO ILÍCITO E NA NÃO COMPROVAÇÃO DO DOLO ESPECÍFICO. PEDIDO DE CONCESSÃO DE INDULTO NATALINO. PEDIDOS CONSEQUENCIAIS DE RESTABELECIMENTO DE DIREITOS POLÍTICOS, DE EXPEDIÇÃO DE ALVARÁ DE SOLTURA, DE EXCLUSÃO DE NOME DO ROL DE CULPADOS E DE FIXAÇÃO DE VALOR MONETÁRIO A TÍTULO DE INDENIZAÇÃO PREJUDICADOS. IMPROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO.- O Ordenamento Constitucional de 1988 elencou a coisa julgada como direito fundamental do cidadão (art. 5º, XXXVI), conferindo indispensável proteção ao valor segurança jurídica com o escopo de que as relações sociais fossem pacificadas após a exaração de provimento judicial dotado de imutabilidade. Sobrevindo a impossibilidade de apresentação de recurso em face de uma decisão judicial, há que ser reconhecida a imutabilidade do provimento tendo como base a formação tanto de coisa julgada formal (esgotamento da instância) como de coisa julgada material (predicado que torna imutável o que restou decidido pelo Poder Judiciário, prestigiando, assim, a justiça e a ordem social).- Situações excepcionais, fundadas na ponderação de interesses de assento constitucional, permitem o afastamento de tal característica da imutabilidade das decisões exaradas pelo Poder Judiciário a fim de que prevaleça outro interesse (também tutelado constitucionalmente), sendo justamente neste panorama que nosso sistema jurídico prevê a existência de Ação Rescisória (a permitir o afastamento da coisa julgada no âmbito do Processo Civil) e de Revisão Criminal (a possibilitar referido afastamento na senda do Processo Penal).- No âmbito do Processo Penal, para que seja possível a reconsideração do que restou decidido sob o manto da coisa julgada, deve ocorrer no caso concreto uma das situações previstas para tanto no ordenamento jurídico como hipótese de cabimento da Revisão Criminal nos termos do art. 621 do Código de Processo Penal. Assim, permite-se o ajuizamento de Revisão Criminal fundada em argumentação no sentido de que (a) a sentença proferida encontra-se contrária a texto expresso de lei ou a evidência dos autos; (b) a sentença exarada fundou-se em prova comprovadamente falsa; e (c) houve o surgimento de prova nova, posterior à sentença, de que o condenado seria inocente ou de circunstância que permitiria a diminuição da reprimenda então imposta.- A Revisão Criminal não se mostra como via adequada para que haja um rejulgamento do conjunto fático-probatório constante da relação processual originária, razão pela qual impertinente a formulação de argumentação que já foi apreciada e rechaçada pelo juízo condenatório. Sequer a existência de interpretação controvertida permite a propositura do expediente em tela, pois tal situação (controvérsia de tema na jurisprudência) não se enquadra na ideia necessária para que o instrumento tenha fundamento de validade no inciso I do art. 621 do Código de Processo Penal.- Completamente inadequada a alegação de que a inicial acusatória apresentada na relação processual subjacente padeceria de ausência de pressupostos elencados no art. 41 do Código de Processo Penal ante o momento em que aventada tal questão: após o trânsito em julgado de édito penal condenatório. Firma-se tal posicionamento tendo em vista que a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que, sobrevindo sentença condenatória (portanto, sem trânsito em julgado), mostra-se preclusa tese de inépcia da exordial acusatória (a propósito: AgRg no HC 190.234/RS, Rel. Min. ASSUSETE MAGALHÃES, SEXTA TURMA, julgado em 27/08/2013, DJe 06/05/2014), de modo que, com maior razão, o reconhecimento da impropriedade da pretensão vindicada pelo revisionando à luz da sobrevinda tanto de r. sentença condenatória como de v. acórdão confirmatório da condenação, ainda mais com a pecha de definitividade da coisa julgada material.- Cumpre ressaltar, ademais, a temeridade com que alegada a suposta ocorrência de "seletividade" do órgão acusatório motivada por "vindicta político partidária paroquiana" na justa medida em que há nos autos apenas ilação nesse sentido sem qualquer demonstração cabal da sua efetiva ocorrência. É premissa basilar do Direito Processual caber a quem alega o ônus probatório da sua afirmação, o que não se verifica destes autos.- Calha ressaltar a correção com que procedeu o órgão colegiado desta E. Corte Regional na justa medida em que a solução da situação aventada pelo então acusado (e atualmente revisionando) de cerceamento do direito de defesa ante a não realização de perícia in loco perpassa pela incidência, ao caso concreto, da norma insculpida no art. 571, II, do Diploma Processual Penal, razão pela qual eventual nulidade relacionada à instrução criminal deveria ter sido arguida no momento oportuno, qual seja, quando da antiga fase do art. 500 do Código de Processo Penal (revogada pela Lei nº 11.719, de 20 de junho de 2008), ou seja, no momento em que ofertadas alegações finais.- O crime previsto no art. 1º, II, do Decreto-Lei nº 201, de 27 de fevereiro de 1967, não traz entre suas elementares a exigência de que o agente público municipal tenha enriquecido ilícita ou indevidamente nem se impõe a presença de dolo específico diverso da utilização, em proveito próprio ou alheio, de bens, rendas ou serviços públicos, aspectos que restaram extreme de dúvidas comprovados quando do julgamento da Ação Penal subjacente.- O pleito de deferimento de indulto natalino é incidente que se manifesta no curso da execução penal, a teor dos arts. 187 e ss. da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984, motivo pelo qual se mostra inadequada a atual via processual eleita pelo revisionando para sua postulação. Ademais, tendo em vista a extinção de sua punibilidade, seria impossível, ainda que passível de conhecimento a temática nesta Revisão Criminal, a concessão de instituto que culmina em extinção de punibilidade já ocorrida.- Prejudicados os pedidos de restabelecimento de direitos políticos, de expedição de alvará de soltura, de exclusão de nome do rol de culpados e de fixação de valor monetário a título de indenização na justa medida em que não acolhidas as pretensões deduzidas pelo revisionando neste expediente.- Após o exaurimento da análise dos pontos aventados pelo revisionando, nota-se que sua intenção está em rediscutir nesta senda aspectos que foram todos apreciados, contextualizados e julgados na Ação Penal subjacente, o que não se coaduna com os limites de cognição consagrados para fins revisionais na justa medida em que o expediente em tela não deve ser interpretado como uma nova possibilidade de haver um julgamento de recurso de Apelação (com a cognição inerente a tal recurso). Em última instância, depreende-se sua intenção em manifestar seu inconformismo com a condenação que lhe foi impingida, condenação esta balizada no amplo conhecimento das provas e dos fatos e da extensiva valoração levada a efeito na Ação Penal que deu origem ao título penal condenatório que se busca desconstituir, o que não se admite ser aventado em Revisão Criminal.- Revisão Criminal julgada improcedente.

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