Habeas Corpus Nº 2007.04.00.013327-4/rs

Associação para o tráfico internacional de drogas. Réu preso. Autos que se encontram conclusos para sentença há mais de seis meses. Tratado firmado entre Brasil e Colômbia. Pedido de extensão do procedimento de extradição. Excesso de prazo. Indefinição quanto ao término da prestação jurisdicional.

Rel. Des. Élcio Pinheiro De Castro

Cuida-se de habeas corpus impetrado por FLÁVIO LUÍS ALGARVE em favor de NEY MACHADO, objetivando a revogação da prisão preventiva decretada pelo MM. Juiz da Vara Federal de Passo Fundo/RS, nos autos da ação penal nº 2005.71.04.007533-5 (IPL nº 2000.71.04.003642-3). Consoante se depreende, o Paciente foi denunciado, juntamente com outros quinze acusados, pela prática do crime de associação para o tráfico internacional de drogas (artigo 14 c/c o art. 18, inc. I, da Lei nº 6.368/76) tendo a peça acusatória sido recebida em 07/07/2000 (fls. 46/58). Segundo o Parquet, NEY seria o comandante da organização criminosa, eis que “foragido da Justiça Brasileira desde 1996 e instalado na região de Capitán Bado no Paraguai, onde ganhou status de 'Patrão', comanda intensa venda, remessa e transporte de substâncias entorpecentes para o Brasil, mormente para o Estado do Rio Grande do Sul, fazendo uso inclusive de aviões (conforme se deduz das conversas interceptadas constantes às fls. 312/19)“. A custódia preventiva dos acusados foi decretada “em prol da segurança social (...) por ser conveniente à instrução criminal e, além disso, necessária para a aplicação da lei penal, já que poderão facilmente se evadir do distrito da culpa (...)“, tendo sido expedido mandado de prisão (fls. 60/5). Em 24.07.2000, foi determinada a cisão do feito, bem como a suspensão do processo e da prescrição no tocante a NEY MACHADO, com apoio no art. 366 do Código de Processo Penal, realizando-se a citação por edital, eis que não encontrado o réu, permanecendo foragido (fl. 66). Considerando a notícia de ter o Paciente sido detido na Colômbia e extraditado para o território nacional em 25/10/2005, o ilustre magistrado a quo determinou o prosseguimento do feito, designando o interrogatório do acusado para o dia vinte e sete de outubro do mesmo ano (fls. 79/82). Após regular instrução processual, em 22 de maio de 2006, foi prolatado despacho indeferindo o pedido de revogação da prisão preventiva decretada, com apoio no art. 312 do CPP (fls. 122/3). Sobreveio decisum publicado em 16/10/2006 que, tendo em vista os termos do Tratado firmado entre Brasil e Colômbia, bem como a circunstância de não ter a extradição do réu sido deferida especificamente para essa ação penal, declarou a suspensão do processo e do prazo prescricional por 6 (seis) meses, enquanto pendente de análise o pedido de extensão do procedimento de extradição, encaminhado ao Ministério da Justiça (fls. 129/33). Contra esse ato insurgiu-se a defesa, sendo proferida decisão monocrática nas seguintes letras: “Trata-se de ação penal proposta contra Ney Machado e outros, denunciados pelo cometimento, em tese, do crime previsto nos artigos 14 e 18, I, da Lei 6368/76. Conclusos os autos para sentença, o feito foi baixado em diligência, com base no art. 502 do CPP. Com arrimo no art. 93 do Código de Processo Penal e no art. 116, I, do CP, suspenso, também, o curso deste processo e o cômputo do prazo prescricional por seis meses, mantida a ordem de prisão preventiva decretada durante a instrução, pelas razões expostas nas fls. 816/820. A defesa, por sua vez, discordando da decisão supra referida, alegou que a nulidade do feito existe desde o momento em que se determinou o prosseguimento do processo e não foi causada pela defesa. Aduziu a inaplicabilidade do enunciado nº 52 da Súmula do STJ. Disse, ainda, que não se aplica ao caso o art. 93 do Código de Processo Penal nem o art. 116, I, do CP, pois não há outra ação cível, bem como porque o reconhecimento da existência da infração penal não depende de qualquer tipo de providência, uma vez que a instrução criminal está encerrada. Referiu que o acusado abre mão da sua manifestação anterior de nulidade para que o processo possa ter o seu regular desfecho, renunciado ao direito de não ser julgado nos presentes autos. O Ministério Público Federal, instado a se manifestar, requereu o prosseguimento do feito com a prolação de sentença (fl. 830). Após o sintético relatório, decido. No tocante à alegação de excesso de prazo, inobstante a argumentação da defesa, entendo plenamente aplicável o teor do enunciado nº 52 da Súmula do STJ. Nesse mesmo sentido, o seguinte julgado do Superior Tribunal de Justiça: 'HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. TRÁFICO ILÍCITO DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. EXCESSO DE PRAZO PARA O ENCERRAMENTO DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. INOCORRÊNCIA. CUSTÓDIA CAUTELAR. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ORDEM DENEGADA. 1. O excesso de prazo para o encerramento da instrução criminal, segundo pacífico magistério jurisprudencial desta Corte, deve ser aferido dentro dos limites da razoabilidade, considerando circunstâncias excepcionais que venham a retardar a instrução criminal e não se restringindo à simples soma aritmética de prazos processuais. 2. Todavia, “encerrada a instrução criminal, fica superada a alegação de constrangimento por excesso de prazo.“ Súmula nº 52 do STJ. 3. As prisões provisórias ou processuais - aí incluídas as prisões em flagrante, preventiva, temporária, decorrente de sentença condenatória recorrível e de sentença de pronúncia - devem, sob pena de constrangimento ilegal, cingir-se, fundamentadamente, à órbita do art. 312 do CPP. 4. Preenchidos os requisitos e ocorrendo uma ou mais hipóteses da prisão preventiva, como se verifica no caso, não há falar em ilegalidade do decreto de custódia cautelar. 5. Ordem denegada. (STJ, HC nº 60893, 5ª TURMA. DJ de 06/11/2006, Relator Min. ARNALDO ESTEVES LIMA). Dessa maneira, não havendo constrangimento ilegal e permanecendo presentes as circunstâncias fáticas delineadas nas decisões das fls. 20/24, 768/769 verso, deve ser mantida a prisão do réu pelas razões então expostas. Em relação à alegação da defesa de inaplicabilidade da fundamentação legal da decisão que baixou o feito em diligência (art. 93, CPP e art. 116, I, CP), cumpre apenas referir que já foram expostas as razões justificadoras da aplicação dos dispositivos legais, nada havendo de mais a reparar. No que tange ao pedido da defesa de prolação da sentença, abrindo mão, o acusado, de ser formalizada a extensão do Acordo de Extradição, cabe referir que o réu não possui o poder de prescindir do direito de não ser julgado, porquanto o Acordo de Extradição foi firmado entre Brasil e Colômbia conforme o Tratado de Extradição aprovado pelo Decreto-Lei 1994/40 e promulgado pelo Decreto 6330/40), que no caso dos autos, resultou na Resolução Executiva nº 61, de 09 de maio de 2002, autorizando o comparecimento do extraditando ao processo penal nº 021396045631, em trâmite perante o Juízo da 3ª Vara Criminal da Comarca de Passo Fundo, neste Estado, conforme dá conta o documento das fls. 217 e seguintes, bem como suas respectivas extensões. Dessarte, o pedido de julgamento imediato do feito formulado pela defesa e a concordância do Órgão Ministerial não têm o condão de sobrepujar a relação de direito internacional público travada entre dois países soberanos. Ante o exposto, com base nas referidas razões, mantenho a suspensão do processo, forte no art. 93 do CPP e no art. 116, I, do Código Penal, permanecendo válida a ordem de prisão preventiva decretada no curso da instrução, com fulcro no enunciado nº 52 do STJ, bem como nos argumentos despendidos nas decisões de fls. (...) Oficie-se ao Ministério da Justiça, em cumprimento ao determinado na fl. 820, in fine, bem como solicitando informações sobre o andamento do pedido de extensão da extradição. Intimem-se. Passo Fundo, 23 de novembro de 2006.“ Face a tanto, foi ajuizado o presente mandamus. Sustenta o Impetrante, em síntese, a nulidade do processo, diante da absoluta ausência de amparo legal para suspender seu trâmite e o prazo prescricional enquanto se aguarda eventual extensão da extradição. Aduz implicar o prosseguimento do feito em violação ao tratado acordado entre Brasil e Colômbia, na medida em que somente poderia ter sido processado e julgado nos autos da ação da penal em que restou formulado o pedido de extradição, não sendo esse o caso dos autos. Alega, ademais, que a autoridade colombiana já informou a impossibilidade de concessão da extensão requerida, haja vista que o Extraditando já se encontra em solo brasileiro. Registra que “não concorda com a decisão que baixou o feito em diligência, determinou a suspensão do curso do processo e ainda manteve sua prisão preventiva, pois está sofrendo prejuízos irreparáveis com a medida“, porquanto, a paralisação do feito por mais de seis meses não é nem um pouco razoável, deixando de justificar a prisão cautelar (...) e não pode o Paciente ser penalizado por nulidade ou embaraço processual a que não deu causa“. Defende, em face disso, a existência de constrangimento ilegal por excesso de prazo, não se aplicando à hipótese dos autos a Súmula 52 do STJ, tendo em conta a indefinição quanto ao término da prestação jurisidicional. Aduz, por fim, não haver motivos concretos que justifiquem a manutenção da custódia cautelar, a qual não deve servir como “pena antecipada“. Nesse contexto, requer o deferimento de liminar para que seja imediatamente revogada a prisão preventiva decretada e, no mérito, a concessão da ordem para “o levantamento da medida de suspensão do processo, considerando a data em que o paciente chegou ao país, bem como a decretação da nulidade absoluta desde o interrogatório, inclusive.“ Em que pesem os doutos argumentos vertidos na inicial, mister referir que a segregação preventiva do denunciado restou devidamente fundamentada nos pressupostos do artigo 312, CPP, consoante decidido pelo eminente julgador singular às fls. 768/9 dos autos originais (fls. 122/3). No caso em tela, a própria natureza dos delitos narrados pelo Ministério Público Federal, per se stante, reveste de gravidade a conduta, evidenciando sua potencialidade ofensiva, bem como a imediata necessidade de preservação da incolumidade coletiva, não se verificando pois o alegado constrangimento ilegal ao status libertatis. Tendo em conta as circunstâncias descritas na peça acusatória, narrando a suposta atuação de NEY como chefe de esquema criminoso destinado ao transporte de substâncias entorpecentes oriundas do exterior, assim como o fato de ter restado foragido por mais de quatro anos, movimentando-se entre Paraguai e Colômbia (notórios fornecedores de drogas) existem indicativos suficientes denotando ser a custódia cautelar indispensável para a manutenção da ordem pública e garantia da aplicação da lei penal. Por outro lado, a discutida nulidade ab initio do processo, bem como a alegação de excesso de prazo são questões controvertidas, que dizem respeito ao próprio mérito do presente mandamus, devendo ser regularmente apreciadas pelo Colegiado no momento oportuno. Ademais, há notícia nos autos de que o Paciente responde a pelo menos outras duas ações penais, estando preso também em razão delas, o que afasta o periculum in mora necessário ao deferimento da tutela de urgência. Assim, ao menos neste juízo provisório, não se vislumbra primus ictu oculi a existência de elementos que autorizem a concessão liminar da ordem postulada. Por fim, não foram anexadas à inicial do presente writ informações atualizadas sobre a situação do processo, tampouco se já foi prolatada sentença, o que somente poderá ser esclarecido a partir dos dados a serem fornecidos pelo ilustre julgador singular. Ante o exposto, indefiro a liminar. Solicitem-se informações pormenorizadas à digna autoridade impetrada, que as prestará no prazo de 05 (cinco) dias. Após, abra-se vista dos autos à douta Procuradoria Regional da República. Intimem-se. Publique-se. Porto Alegre, 10 de maio de 2007.

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