ACR – 14599/PE – 0004822-60.2015.4.05.8300

RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL ROGÉRIO FIALHO MOREIRA -  

PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. ARTIGO 2º, INCISO II, DA LEI Nº 8.137/90. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO E EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE EM RELAÇÃO AO RÉU APELANTE. AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVAS CONFIRMADAS EM RELAÇÃO À ACUSADA. DOLO. EXCLUDENTE DE CULPABILIDADE. ÔNUS DA DEFESA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. DOSIMETRIA. REFORMA PARCIAL DA SENTENÇA. AUSÊNCIA DE CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS. CORREÇÃO. PATAMAR MÍNIMO LEGAL. PENA DE MULTA. PROPORCIONALIDADE. REDUÇÃO. CONDENAÇÃO DA ACUSADA EM VERBA HONORÁRIA À DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. NÃO CABIMENTO. 1-Sentença apelada que condenou os acusados, ora apelantes, pelo cometimento do delito previsto no Artigo 2º, inciso II, da Lei nº 8.137/90, à pena de 10 meses de detenção, em regime aberto, e 20 dias-multa. Apelação do réu HUGO CALADO DE ALMEIDA COSTA: 2-Acusado condenado à pena de 10(dez) meses de detenção, não tendo a acusação recorrido da sentença. 3-Os fatos ocorreram no ano de 2008 (consumação do delito) e o recebimento da denúncia em 22/06/2015, impondo-se a ressalva de que não seria hipótese de aplicação da Lei nº 12.234 de 05 de maio de 2010, que revogou o § 2º do Artigo 110 do Código Penal dando nova redação ao seu § 1º, no que tange à prescrição, em face de os fatos em exame terem ocorridos no ano de 2008, e por serem seus efeitos manifestamente prejudiciais ao réu, incidindo na vedação de retroatividade de lei desfavorável. 4-Transitada em julgado a sentença condenatória para a acusação e a pena em concreto aplicada 10 (dez) meses de detenção, e observado entre a data do fato delituoso ( ano de 2008) e o recebimento da denúncia (22/06/2015) - fls.16/19, excede o prazo legal de 02 anos (CP, Art. 109, VI, na redação vigente à época dos fatos), dando ensejo ao reconhecimento da prescrição. 5-Decretação da extinção da punibilidade, conforme dispõe o Artigo 107, IV, do Código Penal. Aplicam-se os comandos dos artigos 114 do Código Penal, pois quando a multa for cumulativamente aplicada, o prazo de prescrição, quer da pretensão punitiva, quer da pretensão executória, coincidirá com o prazo de prescrição da pena privativa de liberdade (CP, Art.114, II, 2ª Parte), bem como do artigo 118 do mesmo diploma legal (em relação as penas restritivas de direitos), que seguem a sorte da principal, prescrevendo com as mais graves (privativas de liberdade). 6-Prejudicada a análise das demais questões deduzidas na apelação. Apelação da Ré SIMONE BORBA LEMOS: 7-Apurou-se, no âmbito da Receita Federal do Brasil, na Representação Fiscal para Fins Penais nº 10480-728078/201313, que a acusada SIMONE BORBA LEMOS teria deixado de recolher, na condição de responsável pela administração da empresa CALADO E MORAES SERVIÇOS E PEÇAS AUTOMOTIVAS LTDA - ME, valores referentes ao Imposto de Renda Retido na Fonte, no importe de R$ 47.307,62. 8-Sentença apelada que trouxe os seguintes fundamentos: 8.1- as provas da materialidade e autoria delitivas se encontram demonstradas na Representação Fiscal para Fins Penais (fls. 11/12 em apenso); no Auto de Infração (fls. 17/20 e fls. 26 em apenso); nas declarações de ANÍSIO DE MORAES (fls. 50/51 em apenso), de HUGO CALADO DE ALMEIDA COSTA (fls. 35/36 em apenso) e de SIMONE BORBA LEMOS (fls. 55/57 em apenso); no instrumento do contrato social da empresa e sua posterior alteração (fls. 21/25 do apenso); nas declarações das testemunha e informante ouvidos em juízo (fls. 171); bem como nos interrogatórios dos próprios acusados. 8.2- As declarações da testemunha SUELY DA COSTA CARVALHO (DVD de fls. 171), que laborou na empresa entre 2011 e 2014, tendo afirmado que, de fato, na época de sua admissão, HUGO era sócio da aludida pessoa jurídica, bem como que SIMONE realizava pagamentos aos fornecedores e também de tributos, tendo, portanto, autonomia em suas atividades. 8.3-Na fase policial, a própria SIMONE admitiu ter, na prática, o controle financeiro da empresa a partir de 2010 (fls. 55/57 do apenso), o que foi confirmado no depoimento dos outros réus (fls. 50/51 e fls. 35/36 do apenso). E, em sede judicial, a aludida ré só veio a confirmar o que havia dito no inquérito policial (DVD de fls. 171), ou seja, que em 2008 os sócios eram mesmo ANÍSIO e HUGO, tendo SIMONE ingressado na administração apenas em 2010, quando afetivamente passou a administrar as questões financeiras, inclusive o pagamento de tributos. Esclareceu ainda que fora ela quem tomara a iniciativa de realizar o parcelamento do crédito - o que torna ainda mais evidente o fato de ter poder de mando quanto às condutas ora narradas -, tendo deixado de pagar em face de aventada falta de dinheiro. 8.4-HUGO, por seu turno, em sede judicial (DVD de fls. 171), declarou que em 2008 estava mesmo à frente das questões financeiras da empresa e que deixou de pagar Imposto de Renda Retido na Fonte. No mais, aduziu que em 2012 já não participava da administração, o que cabia a SIMONE desde 2010. 9 - Provas que evidenciam a materialidade e a autoria das condutas narradas na denúncia - o réu HUGO foi o autor das condutas ora tratadas entre 2008 e 2010, enquanto a acusada SIMONE fora a autora entre 2010 e 2012. 10 - Dolo evidenciado. Ausência de comprovação de excludente da culpabilidade. Sequer foram comprovadas as alegadas dificuldades financeiras atravessadas pela empresa e que desnatura a atualidade inerente ao estado de necessidade, além de, por ser ônus da defesa, em nenhum momento da persecução penal foi arguida pela apelante a ocorrência de referida excludente. 11-A omissão de recolher valor do tributo, sem dúvida, inviabiliza ou, pelo menos, dificulta a cobrança dos tributos pelo Fisco. Confirmação da procedência da denúncia em face da acusada. DOSIMETRIA: 12-A sentença recorrida valorou negativamente tão somente o comportamento da vítima, fixando a pena-base (em 08 meses) um pouco acima do mínimo previsto (06 meses), vez que o art. 2º, II, da Lei nº 8.137/90, prevê pena de 06 (seis) meses a 02 (dois) anos de detenção, e multa. 13-A sentença apelada entendeu que o comportamento da vítima em nada pode ser entendida como provocador da conduta ilícita da apelante, e nesse passo sopesou negativamente tal circunstância judicial em seu desfavor. 14-A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que o comportamento da vítima é uma circunstância neutra ou favorável quando da fixação da primeira fase da dosimetria da pena (STJ - Resp 897734/PR) e, nesse enfoque, "ao individualizar a pena, não se acolhe a elevação da pena-base ao argumento de que as vítimas não contribuíram para a ação delitiva e não poderiam prevê-la, visto que, por certo, não iriam colaborar para o ato criminoso, não se justificando, assim, a valoração negativa dessa circunstância judicial" (STJ - HC 277853-AL). 15-Pena-base reduzida para o mínimo legal, ante a ausência de qualquer circunstância judicial desfavorável à acusada, fixando no patamar de 06 meses de detenção. Não se vislumbrou a existência de circunstância agravante, tampouco de atenuante e de causa de diminuição de pena. 16-No que se refere à causa especial de aumento da pena - ocorrência da continuidade delitiva (art. 71), diante do período de sucessiva sonegação, com várias condutas praticadas reiteradamente ao longo de dois anos (SIMONE, de 2010 a 2012), foi cabível um aumento mediano -  fixado em 1/4 (um quarto), quando a norma prevê a possibilidade de aumento entre 1/6 a 2/3. 17- Fração fixada em consonância com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, sobretudo quando se tem no caso concreto que a conduta foi perpetrada durante quase dois anos, sendo o critério a ser levado em conta para dosar o aumento (de 1/6 a 2/3) o número de infrações praticadas, não se mostrando viável a fixação no patamar mínimo, como pretende a defesa. 18-Nesse sentido, é o que orienta o Superior Tribunal de Justiça: "Em se tratando de aumento de pena referente à continuidade delitiva, aplica-se a fração de aumento de 1/6 pela prática de 2 infrações; 1/5, para 3 infrações, 1/4, para 4 infrações, 1/3 para 5 infrações, 1/2 para 6 infrações e 2/3 para 7 ou mais infrações" (HC 258.328-ES, RELATOR MINISTRO ROGÉRIO SCHIETTI CRUZ, 6ª TURMA, 24/02/2015; HC 273.262-SP, RELATOR MINISTRO GURGEL DE FARIA, 5ª TURMA, 06/11/2014; HC195872-RJ, 5ª TURMA, RELATOR NEWTON TRISOTTO, 21/05/2015). 19- Pena final fixada como definitiva em 07 meses e 15 dias de detenção (pena-base= 06 meses + 1/4 (45 dias= 01 mês e 15dias - continuidade delitiva), mantido o regime aberto. 20- Guardada a devida proporcionalidade, em face da redução da pena privativa de liberdade para o seu mínimo legal, a pena de multa deve ser reduzida ao mínimo previsto - 10 dias-multa (limites de 10 a 360 - art. 49 do CPB), à razão de um trigésimo do salário mínimo vigente no tempo do fato delituoso (§ 1º do art. 49 do CPB). Mantida a sentença recorrida em relação à acusada SIMONE BORBA LEMOS  nos seus demais termos. 21- Incabível, em sede recursal, a apreciação do pleito da Defensoria Pública da União, deduzido às fls.311/314, atinente à condenação da acusada em honorários advocatícios, porque resultaria em inevitável agravamento do julgado recorrido, até mesmo em virtude de a acusada sequer ter sido intimada ou teve ciência do pedido de condenação de honorários e pagamento à sua própria Representante Judicial neste feito criminal. 22- Apelação do réu HUGO CALADO DE ALMEIDA COSTA provida. 23- Apelação da ré SIMONE BORBA LEMOS parcialmente provida.

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