ACR – 15280/PE – 0008270-07.2016.4.05.8300

RELATOR: DESEMBARGADOR RUBENS DE MENDONÇA CANUTO NETO -  

PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. FRAUDE À LICITAÇÃO. VENDA DE MERCADORIA FALSIFICADA, COMO SE FORA VERDADEIRA. TENTATIVA INIDÔNEA. NÃO CONFIGURAÇÃO. PREJUÍZO À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. DESNECESSIDADE. CRIME TENTADO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DOLO PRESENTE. DOSAGEM DA PENA. NECESSIDADE DE AJUSTES. PROVIMENTO PARCIAL DO APELO. 1. Comete o crime previsto no art. 96, inciso II, da Lei n.º 8.666/93 quem frauda licitação instaurada para aquisição de bens, mediante a venda de mercadoria falsificada, como se fora verdadeira. 2. O crime impossível, também chamado de tentativa inidônea, corresponde ao ato que, pela ineficácia total do meio empregado ou pela impropriedade absoluta do objeto, jamais poderia se consumar. Caso concreto em que, a despeito do impedimento da empresa gerida pelo apelante de licitar com órgãos públicos, o que se observa é que esta sagrou-se vencedora em pregão eletrônico realizado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região, o qual recebeu lote de cartuchos de impressão inautênticos e emitiu a respectiva nota de empenho. Só não ocorreu o pagamento, hipótese em que estaria consumado o delito, porque questionada a autenticidade das mercadorias fornecidas, em inspeção realizada por representante da marca Lexmark Internacional do Brasil Ltda. Afastamento da tese de crime impossível. 3. Embora seja inegável que o art. 96, inciso II, da Lei n.º 8.666/1993 tipifica crime material, o qual só se consuma com o efetivo prejuízo para a Administração Pública, é induvidoso que o delito admite tentativa, razão pela qual passível de punição a conduta que não atinge o resultado desejado, por motivos alheios à vontade do agente (CP, art. 14, inciso II). de uma vez que imputada ao agente a prática de fraude à licitação, em sua modalidade tentada, o fato de não haver sido constatado prejuízo ao erário, não conduz à conclusão de que atípica a conduta perpetrada. 4. Laudo pericial que atestou a inautenticidade dos cartuchos de impressão fornecidos pelo recorrente ao Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região, bem assim de suas embalagens. O prazo de garantia dos cartuchos em nada influenciou o exame pericial, que não analisou o funcionamento das peças, mas se restringiu à identificação de divergências entre o material fornecido pelo recorrente e o padrão enviado pela empresa Lexmark Internacional do Brasil Ltda. Materialidade comprovada 5. Conjunto probatório que permite uma conclusão segura quanto a autoria e o dolo do recorrente de fraudar a licitação realizada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região, mediante a venda, como verdadeira, de mercadoria falsificada. 6. A diferença constatada nos preços de aquisição dos cartuchos era de fácil percepção. Segundo as notas fiscais juntadas aos autos, os cartuchos de impressão inautênticos (2º lote) foram adquiridos por pouco mais da metade do preço dos originais inicialmente fornecidos pelo recorrente (1º lote). Ausência de comprovação, ademais, de que a divergência verificada nos preços dos cartuchos teria decorrido do valor do frete e das diferentes alíquotas de ICMS adotadas nos Estados do Paraná e de São Paulo. 7. Existência de declarações do administrador da empresa que forneceu a mercadoria inautêntica ao recorrente, no sentido de que somente fornecia cartuchos remanufaturados, com preços mais baixos do que o praticado para o produto original, bem assim que tais itens eram embalados em caixas neutras brancas, e não nas caixas entregues ao Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região. 8. Hipótese em que o recorrente assumiu o prejuízo relativo aos cartuchos não originais que adquirira para entrega ao Tribunal Regional Federal da 6ª Região. Inexistência de prova nos autos de que tenha tentado reaver o dinheiro pago pelos itens contrafeitos, os quais ainda estariam em seu estoque. 9. Dosagem da pena. 10. O intuito de obter lucro é inerente ao tipo penal previsto no art. 96, inciso II, da Lei 8.666/1993. O agente que frauda licitação instaurada para a aquisição de bens ou mercadorias, através do fornecimento de produtos falsificados como se verdadeiros fossem, age, naturalmente, com o intuito de obter vantagem financeira. 11. Ausência de provas nos autos de que o recorrente tenha agido de forma premeditada ao entregar o primeiro lote de mercadorias, composto por cartuchos de impressão originais, com o intuito de adquirir credibilidade, legitimando-se como fornecedor confiável, para ter facilitada a prática delitiva. 12. Redução da pena-base de 4 (quatro) anos de detenção para 3 (três) anos de detenção, o mínimo previsto no preceito secundário do art. 96 da Lei 8.666/1993. 13. Não incidência da causa de diminuição de pena do arrependimento posterior (CP, art. 16), eis que referida minorante pressupõe a reparação do dano, o qual não restou configurado no caso concreto. Hipótese em que o Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região identificou a falsidade dos cartuchos antes de efetivar o pagamento, daí não decorrendo dano a ser reparado. Embora o recorrente tenha encaminhado cartuchos originais em substituição aos contrafeitos, tal remessa não se deu por ato voluntário seu, mas após notificação do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região. Além disso, todos os cartuchos de impressão lhe foram devolvidos, tanto os autênticos quanto os falsificados, após o cancelamento do contrato, não sendo mesmo o caso de reconhecimento da minorante do arrependimento posterior. 14. O apelante percorreu a maior parte do iter criminis, tendo se aproximado bastante da consumação do delito, razão pela qual acertada a fixação da causa de diminuição de pena relativa à tentativa no patamar de um terço. Hipótese em que a nota de empenho chegou a ser emitida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região, que recebeu as mercadorias falsas fornecidas pelo recorrente, só não ocorrendo o pagamento porque questionada a autenticidade dos cartuchos de impressão, em inspeção realizada por representante da marca Lexmark Internacional do Brasil Ltda. 15. Redução da pena privativa de liberdade definitiva, dos 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de detenção estabelecidos no decreto condenatório, para 2 (dois) anos de detenção, reprimenda que deverá ser cumprida em regime inicial aberto (CP, art. 33, § 2º, "c") e que restou substituída por duas penas restritivas de direitos. 16. Redução da pena de multa ao quantitativo de 10 dias-multa, o limite mínimo previsto no art. 49 do Código Penal, a fim de compatibilizá-la com a pena privativa de liberdade imposta. Manutenção do valor do dia-multa fixado na sentença condenatória, em um oitavo do salário mínimo vigente na época do crime (dezembro de 2012), por cuidar-se de montante compatível com a situação econômica do recorrente. 17. Apelação parcialmente provida, para reduzir as penas impostas ao recorrente.

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